À beira do precipício pd51 | Page 35

mos, sem ter a exata noção de seu amplo poder corrosivo. Grupos dirigentes inteiros foram chamados às barras da lei, o que desar- ticulou alguns dos mais importantes partidos da redemocratiza- ção e os respectivos projetos de poder. Ao mesmo tempo, o ambiente de terra arrasada, daí nascido, é o mais propício a aventureiros de todos os matizes, que se alimentam da antipolítica que eles mesmos semeiam, ao se colocarem “contra tudo o que está aí”. Esta é a hora clássica dos demagogos. Se as instituições de fiscalização vieram para ficar, com suas exigências de controle e transparência, o sistema político reage e se reagrupa como pode. Tem a seu favor o fato óbvio de que não existe democracia sem partidos e sem Parlamento digno do nome. Velhos comunistas costumavam dizer que a mais medíocre das “democracias operárias” era preferível à mais pujante das “demo- cracias burguesas”. Devemos parafraseá-los em outro sentido: do ponto de vista de uma vida civil moderna, como a que precisa existir no Brasil, não haver democracia parlamentar, verdadeira- mente livre e plural, é o pior dos mundos. Como dissemos, a “classe política” reage, vale-se das regras de financiamento exclusivamente público, aposta na maior visi- bilidade dos detentores de mandato, de modo que se vislumbra um nível baixo de renovação do Congresso e das assembleias estaduais. Eppur si muove, e algo como um processo consti- tuinte, nada espalhafatoso, mas quem sabe promissor, pode estar ocorrendo sob nossos olhos. Este processo, distante de qualquer subversivismo rupturista, atinge um dos pilares da vida institucional: exatamente, o sistema de partidos, às véspe- ras de ser – em parte – racionalizado com a cláusula de barreira já prevista para este outubro. Regras, quando pertinentes, costumam ser bem mais do que meros artifícios técnicos. Já que o voto é livre e as urnas são imprevisíveis, impossível dizer quantos e quais partidos terão plena existência parlamentar e assim poderão condicionar, posi- tiva ou negativamente, o futuro programa de reformas. Sabe-se apenas que serão em número bem menor do que as atuais três dezenas. Deixando de lado qualquer previsão aritmética, aqui propomos um mapa provisório do sistema de forças em surgi- mento, apontando alguns dos prováveis rumos à frente. Já temos de nos haver com uma extrema direita competitiva – e agressiva – pela primeira vez desde a redemocratização. A degradação do discurso público 33