distribuição e consumo.
“A Netflix é uma nova plataforma para oferecer
conteúdo pago, o que, em princípio, é bom e enriquecedor.
No entanto, esta nova forma de consumo não pode tentar
substituir as já existentes, como ir ao cinema, não pode
alterar o hábito de espectadores, e acho que esse é o debate
agora. Para mim, a solução é simples: as novas platafor-
mas devem respeitar as regras atuais, tais como a existên-
cia de janelas de exibição, e cumprir as regras de inves-
timento que já regulam as televisões. É a única maneira
de coexistir. Parece um enorme paradoxo dar uma Palma
de Ouro ou qualquer outro
prêmio a um filme que não
pode ser visto na tela grande.
Respeito as novas tecnologias,
mas enquanto continuar vivo
vou defender algo que as
novas gerações parecem não
conhecer: a capacidade hipnó-
tica de uma tela. Acho que a
tela em que vemos um filme
pela primeira vez não pode
ser parte da nossa mobília,
temos que ser pequenos para
estar dentro do filme que nos
captura” – Pedro Almo-
dóvar sobre a polêmica
decisão da Netflix.
O cineasta Pedro Ribeiro menciona que essa dis-
cussão protagonizada pela Netflix aponta uma certa
“crise cultural e artística” responsável por assolar não
só a indústria como tam bém os meios de consumo do
público e sustenta tal apontamento com um fato que
presenciou na própria carreira profissional, “Quando
fui curador de um festival em Belo Horizonte, fiquei
extremamente triste porque nem mesmo meus colegas
de cinema iam às sessões [gratuitas] no Cine Humberto
Mauro, mas pediam fervorosamente os links dos filmes
online para assistir em casa”. Por outro lado, “na França
[onde reside atualmente], não importa o dia da semana,
os cinemas [a maioria] ficam lotados para quase todo fil-
me, independente do preço”, demonstrando, talvez, que
o problema cultural envolva também uma questão de
tradições e costumes locais.
O Mestre em Comunicação e Doutor em Artes
Eduardo de Jesus acrescenta que a polêmica é
complexa e se coloca nas mais diversas frentes de
discussão: “existe um exercício de poder que se coloca
cada vez que os suportes de difusão da produção audio-
visual mudam ou se expandem. Com o streaming não é
diferente e novas complexidades são inauguradas”. Além
da Netflix, existem cerca de 20 ou mais serviços de
streaming responsáveis por fomentar a produção
independente e autoral, como é o caso do Afroflix .
“Acho que a exibição cinematográfica na sala de cinema é
uma forma central e muito importante, mas não é única”,
complementa o professor que percebe que estamos
experimentando um redimensionamento das formas
de distribuição que passam também pelas já popu-
larizadas plataformas cotidianas do YouTube e do
Vimeo.
Fato é que diante da atual polêmica a organização
do Festival de Cannes
anunciou que filmes que
não tiverem devida circula-
ção em salas francesas não
estarão aptos a competir
pelo o Palma de Ouro a
partir da próxima edição.
Com certeza o assunto
não será encerrado e ainda
vai permear por outros fes-
tivais e premiações mundo
afora até que haja alguma
harmonia. Percebemos aqui
que as discussões são am-
plas e envolventes, portan-
to é necessário que todas
as partes se façam com-
preendidas a fim de que as conclusões ou soluções
encontradas pela indústria não deixem de reconhecer
grandes obras só pelos seus meios de distribuição.
Acho que a exibição
cinematográfica
na sala de cinema
é uma forma
central e muito
importante, mas
não é única
Ben Stiller e Adam Sandler
atuam juntos em “The
Meyerowitz Stories”, um dos
dois filmes da Netflix que
concorriam ao Palma de Ouro
zint.online | 41