Dois anos atrás, este dinheiro sairia da educação e da saúde
sem a percepção de sacrifício, porque a perda não era em quanti-
dade de dinheiro, mas na quantidade de mercadoria comprada; e
era diluído pela inflação. É como se um único tijolo fosse diluído
para fazer dois tijolos com massa fragilizada, deixando as duas
paredes instáveis. É mais procedente adiar a construção da
segunda parede. O milagre da multiplicação dos tijolos serve para
representar o que acontece quando o governo usa inflação para
desvalorizar a moeda e gastar mais do que arrecada. A corrupção
nas prioridades era escondida na corrupção da moeda, provo-
cando a corrupção do acomodamento político.
Agora é possível eliminar a corrupção da moeda, apesar da
grande resistência no imaginário da população, sobretudo pela
manipulação e pelo uso de fake news, ao divulgar que a PEC do
Teto congela cada gasto, quando, na verdade, limita o conjunto
dos gastos ao nível da arrecadação, permitindo que uma despesa
seja ampliada, desde que fazendo a redução de outra despesa.
Graças às dificuldades vividas com a greve dos caminhonei-
ros, constatamos o custo da indústria automobilística para o setor
social e descobrimos uma segunda lição: que é preciso quebrar o
acomodamento político e sair da área de conforto da simples
reivindicação para o esforço da luta por mais recursos, para
educação e saúde, dizendo onde o Estado brasileiro precisa redu-
zir gastos com seus desperdícios históricos, beneficiando a elite,
inclusive na indústria automobilística. Para cobrir os R$ 9,8
bilhões necessários para subsidiar o diesel neste ano, o governo
está retirando R$ 55 milhões do orçamento da educação. Basta-
ria, portanto, pequena mobilização da sociedade para que este
recurso fosse retirado de outro setor. Para se ter uma ideia de
grandeza, basta observar que o Congresso Nacional custará quase
R$ 10 bilhões, este ano. A democracia não seria sacrificada com a
redução de 0,6% de seus gastos.
Temos a chance de lutar para que o financiamento do subsídio
ao diesel não saia do sangue da saúde, nem dos neurônios do
conhecimento. Para isso, será preciso lutar para retirar os
recursos de outras áreas do setor público. Esta é a segunda lição
derivada da absurda greve dos caminhoneiros: para respeitar a
aritmética, temos que escolher entre construir e manter escolas
ou queimar o recurso no transporte com diesel subsidiado.
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Cristovam Buarque