Aprendendo com as tragédias
Cristovam Buarque
C
hama-se “pedagogia da catástrofe” o processo de aprender
com as tragédias que ocorrem ao redor, embora muitas
vezes não se aprenda e as tragédias se sucedam. O mês
de maio de 2018 teve dias catastróficos para o funcionamento do
país, para o dia a dia de cada brasileiro, e até para a confiança
que depositamos no futuro: uma catástrofe que, além dos senti-
mentos trágicos, pode nos dar algumas lições.
A primeira delas é que, todos os anos, há décadas, o Brasil
tira dinheiro da educação, da saúde e do saneamento para finan-
ciar a indústria automobilística, sem que o povo brasileiro
perceba. A greve dos caminhoneiros, associada à PEC do Teto –
que também é pedagógica –, permite mostrar que, para sair da
crise, para barrar a catástrofe, vai ser preciso tirar dinheiro do
orçamento. Para vender carros, era preciso subsidiar juros, dar
isenções fiscais, incentivar venda de caminhões sem a necessá-
ria demanda por frete, endividar o Estado e os cidadãos. Para
fazer as rodovias, usava-se cimento que saía da moradia do povo,
porque ninguém pode usar uma mesma saca de cimento simul-
taneamente em duas obras, um tijolo em duas paredes. Da
mesma maneira que uma só moeda não pode comprar dois
produtos simultaneamente. Apesar disso, iludidos, porque a
inflação enganava a todos, assistimos a prioridade dada à indús-
tria automobilística, sacrificando recursos que poderiam ser
usados em setores sociais.
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