opiniões razoáveis sobre o improviso que, de fato, cercou a decisão
do governo (opiniões que não a contestavam mas alertavam para a
necessidade de sanar o improviso e, na medida do possível, não
incorrer em novos), discursos utópicos e niilistas vinham se reve-
zando e se confundindo em críticas de vários agentes sociais. Vale
dizer que eram discursos veiculados na contramão do sentimento
de esperança que a medida provocou na população em geral, espe-
cialmente naquela objetivamente sitiada pelo conluio entre o tráfico
e a corrupção policial/miliciana, nos bairros pobres do Rio. Mas
não se pode subestimar a capacidade de formadores de opinião
converterem esta esperança em desconfiança e daí em rejeição.
Vivia-se este quadro incerto quando, de modo cirúrgico, profis-
sional, a reação apertou o gatilho. Depois do assassinato, talvez
por força do hábito, ou da mentalidade de ativistas que encaram
a resistência como forma superior de ação, reiterações de condu-
tas anteriores estreitam o espaço para que movimentos sociais,
ONGs, imprensa e organizações em geral da sociedade civil
pactuem uma nova atitude para uma nova situação. O alarga-
mento deste espaço é ainda mais crucial quando se sabe que a
unidade possível da sociedade em favor dos direitos humanos não
alcança unanimidade, ou algo próximo dela. Embora todos falem
em justiça, não poucos a entendem como justiçamento. O apelo à
violência, a opção pelo crime e a negação ou relativização de valo-
res como liberdade, igualdade e fraternidade, enquanto valores
humanos universais, não são práticas asiladas de alguma base
social, embora – e isto é preciso enfatizar – não sejamos uma
sociedade anômica, destituída de valores morais de solidariedade.
Os apocalípticos de plantão deveriam retirar das praças lotadas
em repúdio ao crime não a conclusão insólita de que as pessoas
ali buscam se associar para derrubar uma ordem promotora de
violência. O protesto é contra a desordem e a tristeza que a violên-
cia criminosa espalha e por isso a rua torna-se palco de urbani-
dade, de solidariedade indignada em favor de algo. Mas isto não
nos dá direito a viajar na maionese do idílio: quando a questão é
a defesa de direitos humanos, a parte imensa da sociedade que se
mantém sitiada pelo medo é, na melhor das hipóteses, arena de
disputa intelectual e moral. Disputa que se torna imediatamente
política quando também está em jogo o futuro da democracia, seu
avanço ou sua restrição, como no caso do atentado em tela.
Má notícia para o reformismo democrático é que, num cenário
crítico composto de aspectos políticos, econômicos e morais que
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Paulo Fábio Dantas Neto