Riscos que nos ameaçam PD50 | Page 174

Política! A vida é maravilhosa, porém de repente tudo se vai. Como diz o Álvaro de Campos, vulgo Fernando Pessoa, depois que nos formos só seremos lembrados em duas datas, aniversariamente: quando fizer anos que nascemos e quando fizer anos que morre- mos; mais nada, mais nada, absolutamente mais nada. Um nasceu cem anos depois do outro. Os dois completariam, lado a lado, 300 anos neste mês em que estamos. Marx e meu amigo que se foi em março de 2015, o camarada Armênio Guedes. Tenho agora em minhas mãos os textos de um livro a ser publi- cado em homenagem ao centenário do Armênio, 33, escritos por amigos seus de verdade. Armênio nasceu no dia 30 de maio de 1918, em Mucugê, na Bahia. O velho Marx, no dia 5 de maio de 1818, em Tréveris, na Alemanha. Estive seguidamente com os dois. Ao alemão fui apresentado por meu pai – que também nasceu em maio, no dia 9, em 1916 – quando tinha 15 anos. Entregou-me um livro de Marx – não me recordo se o Manifesto ou outro –, recomen- dando-me que o lesse com atenção. Em 1955, a televisão e a internet ainda não existiam como instrumentos do modo de produção social que está por aí. Os jovens liam, alguns também escreviam. Do Armênio aproximei-me nos anos 1980. Quando ele se foi, escrevi um pequeno texto no qual afirmei que lá se fora o Júlio, o Tio, como o chamavam seus companheiros de exílio – Cecília, sua mulher, minha amiga, passou a vida toda chamando-o de Júlio! Afirmei, então, que, naquele momento, era como se eu corresse os olhos, dominando o tempo, por inúmeros instantes do passado. Em Paris, em minha casa em Tiradentes (MG), em São Paulo. Armênio ensinando o futuro à minha filha. A mim recomendando prudência, mais de uma vez. Lá se fora o amigo mais sereno. Seu olhar desdobrava espe- rança, paz. Revolucionar o mundo, construir a fraternidade, mas em paz, harmonia e paz. Alguns amigos em volta do seu corpo, de repente o chão se abrindo para que a matéria fosse levada para sempre. Antes, durante breves instantes, confraternizamos. Esti- vemos mais próximos do que nunca, entre nós e a ele. Uns foram capazes de dizer algumas palavras. Faltaram-me forças para mencionar o quanto o meu velho camarada me ensinara, para ao menos sussurrar a palavra amizade. Alguém trouxera, para ser 172 Eros Roberto Grau