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As cenas de violência prosseguem na narrativa em vários espaços, conversas e
situações. Um marido não aceita a rejeição da esposa e a estupra, o outro espanca a
mulher na frente dos filhos. Aparece também a questão da escola frequentada só por
meninos e a luta do professor para que também as meninas frequentem a escola, o que
encontra a resistência dos pais. A sogra que não aceita a nora e quer que o filho a
repudie. A falta de água e o desinteresse dos políticos em resolver a questão.
Tudo isso pode ser analisado pela ótica da política e do poder. Alberto Tosi
(2004, p.22-23) afirma que “a política é uma tentativa de resolução não violenta das
disputas, que ocorre no âmbito do Estado e baseiam-se em regras definidas.” No bojo
dessa reflexão sobre política ele destaca que: “Sempre que falamos em obedecer regras
e em punir quem as desobedece estamos falando duma relação de poder”. Nesse
sentido, o roteiro do filme explora de forma interessante os costumes enraizados nessa
comunidade islâmica radical, com machismo exacerbado, o que dá margem para revelar
o quanto as tradições podem ser reavaliadas e alteradas.
O enredo é explícito ao tratar questões relacionadas às tarefas e à condição de
vida doméstica aliadas a subalternidade feminina no exercício da sexualidade. As
mulheres estão reunidas lavando roupa no rio e mais uma vez o lugar de fala e de
resistência aparece na intervenção e na voz de Velho fusil que canta:
“ a mulher é uma rosa de sua vida, faça um buquê. A mulher é uma brisa que
suaviza com o calor. A mulher é mel que escorre da colmeia. A mulher é um mar.
Quantos rios ela alimentou? E quantos oceanos ela encheu? ” De repente sua voz muda
de tom e se torna mais enérgica:
“A mulher é u m capacho pisado por quem quer que seja. A mulher é co mo o
animal, u m burro de carga para o ho mem. Para agradá-lo, ela faz as tarefas.
Co mo burro, que carrega o fardo sozinho. Que vergonha, suas tontas,
completamente subjugadas. Acordem! Se eles são cegos, enxerguem por
dois! Ergam as cabeças, como bandeiras, se não querem ser devoradas!
Ela termina dizendo:
“Velho fusil, suas palavras são balas. Amemos -nos um pouco. Seus corações
são água estagnada, cheios de espíritos do mal. Se vocês cederem não serão
mais amadas por isso. Acordem seus corações, suas covardes! Mostrem seus
sentimentos e sua coragem ou sua vida atolará como u m pé na lama”.
No poema cantado vemos toda ambiguidade da experiência e existência dessas
mulheres que se encontram como sujeitos subalternos vivenciando um processo de
Redescrições - Revista online do GT de Prag matis mo, ano VI, nº 1, 2015 [p. 19/26]