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Putnam nos diz que “a visão positivista lógica original era de que um ‘fato’ era
algo que podia ser certificado por mera observação e até mesmo por um mero relato de
uma experiência sensorial.” (2008a, p. 39). Assim, os positivistas esperavam poder
fornecer ou encontrar um método de verificação que pudesse estabelecer a justificação
racional, e esse método, ou métodos, deveriam dar conta de verificar as pretensões
cognitivas lançadas pelas diversas classes de enunciados (PUTNAM, 1992, p. 141).
Esses métodos de justificação racional, almejados pelos positivistas lógicos, que
encerram a verificação (ou, abstratamente, a demonstração13), procurarão, assim, arrolar
a forma por meio da qual a testabilidade, e a própria descrição dos métodos de
justificação racional, poderá dar conta do significado dos enunciados. Essa é uma
concepção
criteriosa
da
racionalidade,
“segundo
a
qual
existem
normas
institucionalizadas que definem o que é e o que não é aceitável racionalmente” (1992, p.
146). É intrínseco à concepção criteriosa da racionalidade que esses critérios tenham um
caráter público, de forma que deles possam fazer uso qualquer indivíduo que saiba deles
dispor.
Desse modo, os enunciados que não puderem ser submetidos ao método serão
declarados carentes de significado. Destarte, se um enunciado não puder ser
comprovado pelos meios colecionados, quais sejam, métodos matemáticos, métodos
lógicos, ou métodos científicos14, seguir-se-á que não haverá significado cognitivo
algum que lhe seja relevante (1992, pp. 141-142). Esse crivo pelo qual devem passar os
enunciados com pretensões cognitivas deve ser aplicado a todas as espécies de
enunciados.
Entretanto, Putnam afirma, como foi supracitado, que os positivistas, ao fim e ao
cabo, possuíam uma noção de fato que estava profundamente ligada à verificação pela
via sensorial, ou, dito de outro modo, “que um enunciado significativo deve ser
conclusivamente verificável por confrontação com a experiência direta” (PUTNAM,
2008a, p.39). Isso não se ajusta, em muitos casos, à adoção da via científica como
13
Trata-se de demonstrações lógicas. No caso do critério de que os enunciados cognitivamente
relevantes devam ser passíveis de verificação e testes, estamos a falar de enunciados sintéticos; no caso
daqueles que são verdadeiros ou falsos em razão das regras lógicas e significado dos termos, estamos a
falar dos enunciados analíticos.
14
É importante notar que até a publicação da obra de Carnap intitulada Logical Foundations of
Probability (1950), os positivistas lógicos supunham haver, segundo Putnam, “um método formal (lógica
indutiva), e que o trabalho continuado podia resultar numa enunciação explícita deste método, uma
formalização da lógica indutiva comparável à formalização da lógica dedutiva que fora realizada partindo
da obra de Frege 1879” (PUTNAM, 1992, pp. 233-234). As características dessa convicção serão
estudadas no capítulo 1 deste trabalho, quando da descrição geral do positivismo lógico.
Redescrições - Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 49 a 76]