Revista Redescrições | Page 49

49 Do não cognitivismo ao cognitivismo dos enunciados éticos – a mudança nas noções de fato e de objetividade em Hilary Putnam. Alexandre de Freitas de Mello Junior* RESUMO: Este artigo será dividido em duas partes. Na parte inicial, procuraremos mostrar que o positivismo lógico é tributário de uma noção de fato herdada do empirismo clássico. Nosso interesse é revelar a consolidação dessa dicotomia1, que em muitos aspectos é análoga à dicotomia entre fato e valor. Ambos os binômios conceptuais, que de início eram simples distinções, tornaram-se dicotomias por meio de uma inflação dos seus conceitos. Na segunda parte, apresentaremos a dicotomia fato/valor, mostrando o périplo do argumento putnamiano, que irá nos revelar o imbricamento entre as noções de fato e valor. Assim, é interessante apresentar o raciocínio que revelará a Putnam a constatação da fratura interna de uma dicotomia (analítico/sintético), impetrado por Quine2, para, posteriormente, chegarmos à ideia principal do solapamento da dicotomia fato e valor. Depois disso feito, poderemos considerar a suposição da objetividade (de alguns) dos valores éticos. Palavras-chaves: Empirismo. Fato. Valor. Dicotomia. Objetividade. Ética. ABSTRACT: This article will be divided in two parts. In the first part, we aim to show that logical positivism is a notion actually inherited from classical empiricism. Our interest is to reveal the consolidation of this dichotomy, which in many ways is analogous to the dichotomy between fact and value. Both conceptual dichotomies, which initially were simple distinctions became dichotomies through an inflation of its concepts. In the second part, we present the fact/value dichotomy, showing the journey of Putnam’s argument, which will reveal the entanglement of the notions of fact and value. Thus, it is important to present the reasoning that reveal to Putnam the internal fracture of a dichotomy (analytic / synthetic), put by Quine, to then get to the main idea of undermining the dichotomy between fact and value. Once that is done, we may consider the assumption of the objectivity of (some) ethical values. Keywords: Empiricism. Fact. Value. Dichotomy. Objectivity. Ethics. 1 Não temos o intuito de fazer uma análise crítica da distinção entre o analítico e sintético. Nosso objetivo, ao analisar essa distinção, é apresentar a formação de uma dicotomia, ao invés de expor os motivos pelos quais muitos enunciados não podem ser classificados como analítico ou sintético, de maneira estanque. 2 Quine é o autor do artigo Dois Dogmas do Empirismo, no qual ele apresenta a questão de um dos dogmas, a divisão entre as verdades analíticas e as verdades sintéticas estar mal fundamentada. Putnam não se delongará na argumentação quineana sobre a dicotomia analítico/sintético, pois não é o argumento de Quine em si que está no centro de sua análise. O que nos interessa aqui é mostrar que a distinção entre o analítico e o sintético não leva a uma dicotomia, bem como no caso da distinção entre os juízos de fato e os juízos de valor. Redescrições - Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 49 a 76]