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Do não cognitivismo ao cognitivismo dos enunciados éticos
– a mudança nas noções de fato e de objetividade em Hilary
Putnam.
Alexandre de Freitas de Mello Junior*
RESUMO:
Este artigo será dividido em duas partes. Na parte inicial, procuraremos mostrar que o
positivismo lógico é tributário de uma noção de fato herdada do empirismo clássico.
Nosso interesse é revelar a consolidação dessa dicotomia1, que em muitos aspectos é
análoga à dicotomia entre fato e valor. Ambos os binômios conceptuais, que de início
eram simples distinções, tornaram-se dicotomias por meio de uma inflação dos seus
conceitos. Na segunda parte, apresentaremos a dicotomia fato/valor, mostrando o
périplo do argumento putnamiano, que irá nos revelar o imbricamento entre as noções
de fato e valor. Assim, é interessante apresentar o raciocínio que revelará a Putnam a
constatação da fratura interna de uma dicotomia (analítico/sintético), impetrado por
Quine2, para, posteriormente, chegarmos à ideia principal do solapamento da dicotomia
fato e valor. Depois disso feito, poderemos considerar a suposição da objetividade (de
alguns) dos valores éticos.
Palavras-chaves: Empirismo. Fato. Valor. Dicotomia. Objetividade. Ética.
ABSTRACT:
This article will be divided in two parts. In the first part, we aim to show that logical
positivism is a notion actually inherited from classical empiricism. Our interest is to
reveal the consolidation of this dichotomy, which in many ways is analogous to the
dichotomy between fact and value. Both conceptual dichotomies, which initially were
simple distinctions became dichotomies through an inflation of its concepts. In the
second part, we present the fact/value dichotomy, showing the journey of Putnam’s
argument, which will reveal the entanglement of the notions of fact and value. Thus, it
is important to present the reasoning that reveal to Putnam the internal fracture of a
dichotomy (analytic / synthetic), put by Quine, to then get to the main idea of
undermining the dichotomy between fact and value. Once that is done, we may consider
the
assumption
of
the
objectivity
of
(some)
ethical
values.
Keywords: Empiricism. Fact. Value. Dichotomy. Objectivity. Ethics.
1
Não temos o intuito de fazer uma análise crítica da distinção entre o analítico e sintético. Nosso
objetivo, ao analisar essa distinção, é apresentar a formação de uma dicotomia, ao invés de expor os
motivos pelos quais muitos enunciados não podem ser classificados como analítico ou sintético, de
maneira estanque.
2
Quine é o autor do artigo Dois Dogmas do Empirismo, no qual ele apresenta a questão de um
dos dogmas, a divisão entre as verdades analíticas e as verdades sintéticas estar mal fundamentada.
Putnam não se delongará na argumentação quineana sobre a dicotomia analítico/sintético, pois não é o
argumento de Quine em si que está no centro de sua análise. O que nos interessa aqui é mostrar que a
distinção entre o analítico e o sintético não leva a uma dicotomia, bem como no caso da distinção entre os
juízos de fato e os juízos de valor.
Redescrições - Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 49 a 76]