Revista Redescrições | Page 28

28 conformar-se como sendo uma prática social que atende um projeto democrático de esperança de melhoras futuras; (b) observar-se como práxis explanatória em casos concretos do uso de outros vocábulos como “justiça” ou “solidariedade”. Lembremos que Rorty aceitaria que as narrativas científicas, mesmo as que se dariam no âmbito do direito, continuariam a ser consideradas. No entanto, elas teriam que concorrer com outras narrativas tão ou mais importantes do que as científicas. Isso se daria, por exemplo, no momento que uma juíza resolvesse lançar argumentos “filosóficos” ou “sociológicos” numa decisão ou atuasse em um debate utilizando de sua experiência sensível, adquirida através da leitura da poesia ou da prosa romancista social. O emprego do termo “direito” em vários contextos faz nos lembrar, ademais, que seu conceito não pode ser fixo, sob a consequência de ser perdido no tempo. Importante é, nos contextos de emprego do termo, lembrarmos de seus contextos sócio-históricos e suas originais ligações com outras áreas do conhecimento. Direito e solidariedade No entender de Rorty, a necessária coexistência com outras pessoas que são diferentes de nós, em que pese estarem no mesmo grupo ou sociedade, provocaria a ampliação do sentimento de solidariedade. A contingência da linguagem seria positiva, trazendo sentimentos de responsabilidade pelo próximo e imprimindo o que ele designa como “progresso moral”46. Segundo a aproximação rortyana, juristas seriam também criadores de si próprios, no sentido de que podem escapar do vocabulário moral e político tradicional, no qual estão socializados e redescreverem (contarem estórias sobre) seu próprio papel na prática em que atuam. Tornar-se-iam, assim, novas pessoas, ao “re-formar suas próprias imagens” (cf. RORTY, 1991b, p. 136). Ao reinventarem-se, os juristas procuram novas formas de descrever o que interpretam ou analisam, ao observarem expressões como p. ex. “fato jurídico”, buscariam compreendê-la fora das amarras de descrições estritamente científicas. 46 Como ocorre com outras palavras, o uso da expressão “progresso moral” não implica na existência de uma essência ou natureza da “moralidade”. Como acima explicado, Rorty se afasta completamente da explicação filosófica sobre a natureza ou essência de conceitos. Cf. RORTY, 2007a, p. 193. Redescrições – Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 7 a 48]