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A terceira exegese histórica que explica o ponto de Sloterdijk é uma
interpretação de O Político de Platão, uma discussão feita para desenvolver regras
racionais para a política – a arte de pastorear a polis. Nesse diálogo, como aponta
Sloterdijk, não são só as regras pelas quais as pessoas estariam dispostas a serem
governadas que estão em questão. Há ampla evidência de que os princípios pelos quais
poderia ser possível produzir sujeitos complacentes, bons cidadãos, estão também sob
consideração. Está conectado a Platão que “as regras para o parque humano” do título,
ou mais precisamente, as regras para a administração do menschenpark substituem o
“códex de antropotecnologia”. No curso do diálogo, ele afirma, as “regras de
comportamento”, aquelas pelas quais agentes racionais livres voluntariamente
governariam a si mesmos, são gradualmente substituídas por um “códex de
consentimento”, características de indivíduos, por quem eles podem ser criados por
correspondência criteriosa que os fará cidadãos produtivos de um estado bem
governado.
O que Platão põe na boca do Estranho é o programa de uma sociedade
humanística que é incorporado em um único Alto-Humanista (HighHumanist), o senhor do régio pastoreio. A tarefa desse Super-Humanista
(Uber-Humanist) seria não menos que o planejamento das características de
uma elite, cujos membros devem ser nutridos para o bem de todos.3
A tarefa do Humanismo é a “domesticação” do homem, reprimir a bestialidade e
encorajar a civilidade; mas o fim da cultura literária deixa apenas a companhia da leitura
e a criação como meios restantes disponíveis para o avanço da civilização.
III. Interpretando a mensagem
Se isso é o que ele está sugerindo, o que cabe a nós fazer?
Quando li o “Elmauer Rede” pela primeira vez, vislumbrei ali uma faísca de
sensacionalismo. À medida que observava mais atentamente os textos sobre os quais ele
construía sua estrutura de analogia, comecei a apreciar mais a extensão com que
Sloterdijk conhece e entende a tradição da qual ele está anunciando o fim. Não resta
dúvida de que suas interpretações dos três grandes textos aos quais se refere são leituras
“puxadas” (porque facilmente contestáveis). Como uma fã de longa data de trocadilhos
3 Ibidem, p. 14. (tradução da autora)
Redescrições – Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 131 a 140]