Revista Redescrições | Page 128

128 realmente autoconsciente – isto é, verdadeiramente subjetivo. Mas vamos considerar o caso em que o sujeito prefere resignação e serventia à morte. O sujeito servil hegeliano cria um estado – como uma prisão para seu mestre, que é reduzido ao papel de cidadão sob o controle da lei. O sujeito pós-desconstrutivo resignado contemporâneo constrói a internet – como uma prisão para o tradicional sujeito mestre do pensar sendo reduzido ao papel de um usuário da rede e de um “provedor de conteúdo”. Aqui, o sujeito servo desiste da sua mensagem e passa a servir a mensagem de outros – ele se torna um servidor. Ele se torna Google, Facebook, Wikipedia e inúmeras outras agências da internet. Por fazer isso, o sujeito servil resignado captura e coloca todos os “provedores de conteúdo” – todos os supostos mestres das mensagens deles – em uma prisão da mídia de rede. Não acidentalmente, os sites individuais no Facebook todos parecem epitáfios; e toda a rede parece um grande cemitério e, ao mesmo tempo, um fórum para pós-mortais, pós-desconstrutivas conversas. O sujeito servil serve ao sinal do fluxo – assim eles podem fluir mais ainda. Mas ao mesmo tempo isso canaliza o fluxo de informações por controlar não só seu significado, mas precisamente seu lado material – sua direção, sua quantidade e assim vai. E esta operação de controle – canalização, direcionamento, entrega – não é inocente. A mensagem mesma da mídia é, como já foi dito, uma mensagem zero, puro barulho, caos. O trabalho de ordenação, canalização do sujeito servo operante (e é o sujeito servo operante, sem a mensagem, que opera nossa mídia – não o poder anônimo descrito por Foucault – que traz ordem para o caos da mídia. Entretanto, por canalizar a informação, o sujeito operacional produz sentido – mesmo que o faça indiretamente, na maneira de auto-ocultamento. Portanto, o sujeito servil nunca pode pôr a si mesmo além de suspeitas de corrupção, manipulação e tendo uma motivação escondida – isto é, a de usurpar o lugar do mestre. O único modo de evitar essa suspeita é remontar à cena original da luta entre a mensagem subjetiva e o caos da mídia. Isto é o que a arte avant-garde do século vinte fez, e é o que certo tipo de arte contemporânea ainda faz hoje. Em seu diário Flight Out of Time, Hugo Ball descreve o “poema simultâneo” que foi apresentado por Huelsenbeck, Tzara e Janko, em 29 de março de 1916, no Cabaret Voltaire, no qual a pontuação do recital era constituída de recitativos paralelos Redescrições – Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 125 a 130]