Revista Municipal de Gouveia | Page 35

35 PATRIMÓNIO GOUVEIA | REVISTA MUNICIPAL contra na posse de privados sem a devida comunicação às entidades tutelares do ou praças que dão acesso às lojas e às habitações e organizavam a vida social. património arqueológico português. Subsistem ainda três conjuntos destes na freguesia, a Quintã do Gorgulhão, a Dr. Fora estas notícias que não nos permitem chegar a conclusões, por dispersas, as José Guerrinha e a do Pedrão. referências de que dispomos para Folgosinho não vão além da Idade Média com Folgosinho manteve-se como concelho autónomo até à reforma administra- o mais antigo registo referente a Folgosinho a datar de 1169, no foral concedido tiva liberal de 1836, passando a integrar o concelho de Gouveia até aos dias a Linhares por D. Afonso Henriques, onde surge como um dos limites territoriais. de hoje. No séc. XVII, na obra Poblacion Genereal de España. Sus trofeus, blasones e con- Com a antiguidade de grande parte do casario a ser uma constante por toda a quistas históricas o autor refere que Folgosinho tinha “una Paroquia. Fundóla el freguesia, só a pujança mineira dos anos 1930/1940 conferiu uma nova área Rey Don Sancho I de Portugal años 1188.”8 habitacional na zona que se chama Outeiro, preservando a zona mais antiga No entanto, é ainda referenciada no foral de Gouveia como limite desta, receben- conhecida, a do “fundo da vila”, o que nos permite fazer uma leitura, mais do, então, o seu próprio foral de D. Sancho I no ano de 1187 confirmado em 1217 ou menos “limpa” de Folgosinho nos finais da Idade Média, que terá crescido por D. Afonso II. em direcção ao Largo do Pelourinho, onde se instalou a “casa da câmara” e a A sua autoridade e autonomia como terra de El-Rei são reforçadas no foral novo cadeia a ladear o pelourinho original, já que o que subsiste é um cópia feita de 1512, concedido por D. Manuel I. Esta autonomia em relação aos seus do- na década de 1930. natários ainda hoje é comprovada na ausência de solares e palácios que nos Como se viu, a informação que chega até nós é também escassa, pelo que se permitam relacionar a nobreza com esta localidade. Esta ausência não significa confere de inegável valor para o conhecimento da nossa história o levantamento que não tivesse donatários, mas significa que os cavaleiros-vilãos, homens-livres dos cruciformes, símbolos mágico-religiosos, torsas, inscrições ou outros elemen- próximos da nobreza, mas não nobres, desta vila, tinham grande influência na tos que nos remetam para o desenvolvimento urbano desta freguesia no final da vida comunitária, pois os seus senhores estariam a viver nas cortes ou em outros Idade Média e Época Moderna. pólos urbanos, simplesmente recolhendo os seus direitos e rendas, compondo os Como o objectivo final do presente levantamento passa por conhecer as judia- vilãos e o clero o topo da pirâmide social de Folgosinho de então. rias, os judeus e os cristãos-novos de Folgosinho, vamos remeter este trabalho ao Isto não significa que a freguesia se caracterize somente por casario de arquitectu- conhecimentos das habitações que apresentem estas marcas, associadas a estas ra modesta, pois não dispondo de solares ou palácios, existem diversos elementos comunidades, traçando um quadro social e económico da morfologia e tipologia ornamentais ricos nas fachadas dos imóveis, como os lintéis decorados, que repre- das ruas e imóveis. sentam um certo desafogo financeiro dos seus antigos proprietários, mesmo não As marcas a que nos reportamos vão ao encontro das tipologias definidas por sendo grandes senhores. Carmen Ballesteros10 (as marcas na mezuzot, as marcas/rasgos longitudinais, as Seriam, ao invés disso, ligados a uma classe mercantil, que desta forma exterio- cruzes católicas e as abreviaturas católicas) e por Emílio Fonseca Moretón,11 como rizavam o seu sucesso e desafogo financeiro como prova uma carta de D. Pedro, as torsas e ombreiras trabalhadas em bisel; os lintéis em falso arco canopial de dada em Folgosinho a 24 de Novembro de 1345, em que confirmava todos os formato oblongo, de estilo manuelino; as “peanas”, que são saliências em pedra privilégios aos ourives locais.9 colocadas ao lado da janela, de suporte para o chanukiá, candelabro de 9 braços É impossível dissociar a freguesia dos casais nos planaltos da serra, onde o cul- utilizado na celebração do Hanuca; os rebaixamentos,12 que são estruturas poli- tivo de centeio e a pastorícia compunham grande parte do tecido económico da das nas jambas das ombreiras, com vários tamanhos e por vezes repetidas, des- região. Assim como as práticas comunitárias que ainda hoje subsistem, como o tacam-se pela suavidade ao tacto causado pelo polimento da pedra; e pequenos sorteio dos baldios para cultivo e pastorícia, ou a existência das “quintãs”, pátios bancos de pedra e/ou balcões para expor os produtos ou trabalhá-los.13 8 Consulta online em http://bibliotecadigital.jcyl.es/es/consulta/registro.cmd?id=4565 - 12/03/2015 Ficheiro digital do DGARQTT - PT/TT/CHR/K/29/69-235 10 BALLESTERO, Carmen, Marcas de simbologia religiosa judaica e cristã – para um levantamento prévio em povoações da raia portuguesa e espanhola, in Ibn Maruan nº6 – 1996, p.151 11 MORETÓN, Emílio Fonseca, Viviendas de judios y conversos en Galicia y Norte de Portugal, Anuario Brigantino de Betanzos nº27 (2004) 12 Utilizamos a terminologia rebaixamento, traduzida directamente do espanhol e da terminologia empregada por Moretón, “rebajes” 13 MORETÓN, Emílio Fonseca, Viviendas de judios y conversos en Galicia y Norte de Portugal, Anuario Brigantino de Betanzos nº27 (2004), p.434 9