Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre 9ª edição | Page 61

LiteraLivre nº 9 – Maio/Jun de 2018 Escuro Amanda Piazza Florianópolis/SC Era noite de névoa. Os galhos retorcidos em formas humanas balançavam ao vento, emitindo fortes ruídos. As folhas voavam em redemoinho, e a lua, cheia, era encoberta pela neblina cinzenta que obscurecia todo o cenário. A caçamba de lixo se empanturrava com um banquete de gordos sacos pretos, alguns itens soltos tomavam seu rumo naquela noite outonal. Ao longe, um vulto branco manchava o lugar. Os passos sobre as folhas secas marcavam o único sinal de vida. O vulto foi pouco a pouco se transformando em rosto e uma mulher surgiu da neblina. Seus cabelos castanhos embaraçados emolduravam um rosto pálido e um corte na testa. Uma gota fina de sangue saía do machucado, pingando em seu vestido branco. Dos dedos magros despontavam longas unhas, que agarravam um saco de lixo. Ela parou diante da caçamba e se sentou ao lado de uma das árvores. Emitiu um longo suspiro, olhou para o céu e derramou algumas lágrimas silenciosas. O vento alvoroçava seus cabelos e produzia ruídos no saco depositado no colo da mulher, que se mantinha estática. Passou as mãos no rosto, como que para secar as lágrimas, se levantou e pegou o saco de lixo. Jogou-o na caçamba, virou a cabeça para os lados e voltou pelo mesmo caminho que chegara. Era noite de névoa. Os galhos retorcidos em formas humanas balançavam ao vento, emitindo fortes ruídos. As folhas voavam em redemoinho, e a lua, cheia, era encoberta pela neblina cinzenta que obscurecia todo o cenário. A caçamba de lixo se empanturrava com um banquete de gordos sacos pretos. Dentre eles, havia um jogado ali recentemente. Uma mãozinha carnuda aflorou dele, e um choro infantil rompeu o ar enevoado. 56