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LiteraLivre nº 9 – Maio/Jun de 2018
Votar em prol de um país pior
Ricardo Nunes Simões
Loures - Portugal
Fui votar pela primeira vez e, assim que coloquei o voto na urna,
arrependi-me. O que me vale é que só votei para as Autárquicas, porque se fosse
para as Legislativas a minha consciência teria ficado bem mais pesada. Não me
interessa muito a opinião de pessoas sobre o facto de o voto ser um direito ou
um dever do cidadão. Eu sei que o meu voto é considerado um direito porque eu
tenho o direito de tê-lo, logo tenho o direito de considerá-lo. E decidi considerá-lo
um direito.
Sem dúvida que não há pior sensação do que quando nos consideramos
ultra intelectuais e conhecedores de matéria, em que, de facto, somos autênticos
eruditos, e um paspalho qualquer decide atirar bitaites retardados para o meio da
atmosfera, fazendo com que nós acabemos por respirar aquilo. Eu senti-me o
atirador de bitaites quando fui votar. Contaminei o ar, mas foi sem querer. Se eu
percebo menos de política do que o Trump, para quê votar? Se calhar deveria
estudar o assunto, para poder votar e sentir-me um verdadeiro cidadão – dirão
alguns. Isso seria tornar o meu direito num dever, porque o meu interesse em
estudar política é muito mais pequeno do que um anão que sofreu um aborto.
Podem dizer-me que se trata de falta de opinião e eu agradecer-vos-ei, porque,
até então, não tinha ainda descortinado o termo que mais se apropriasse à
privação das minhas crenças. Sou uma pessoa com falta de opinião política e,
como tal, não devo votar para não estragar isto ainda mais, se é que dá. Cada
vez que toco na política, vou apalpando terreno, como que lhe fazendo cócegas,
para perceber até que ponto ela se queixa das barbaridades que eu digo e até
onde pode ir a minha penúria. Geralmente estico-me e acabo por ir bastante
longe e, depois disso, sinto remorso.
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