Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre 9ª edição | Page 122

LiteraLivre nº 9 – Maio/Jun de 2018 Ao lado, de uma pequena vitrine, ouvi outra voz: Não se deixe levar por estes arrogantes. Eles não estiveram presentes em todos os filmes, mas eu sim. Sempre estive calçado em seus pés, caindo fora uma ou outra vez, mas sempre presente. Lembro que até quase fui comido, no desespero da fome do Klondike. Eventualmente cheguei a ser substituído por patins, dadas às circunstâncias. Imediatamente houve o revide: Este objeto rés-do-chão não tem nossa beleza e apresentação. Acho que a última vez em que viu graxa foi na loja de onde veio. Nós somos a nota aristocrática do nosso errático malandro. Participamos ativamente das mais importantes cenas. Voltei a falar baixo, para eles, sentindo-me um bobo: Mas vocês três foram da maior importância na obra dele. São conhecidos mundialmente. Qualquer pessoa do mundo ocidental que veja vocês três em conjunto identificará de quem estamos falando. Meu pensamento foi longe, lembrando o incontável número de vezes que assisti a seus filmes todos. Quando eu era garoto, seus curtas já passavam na televisão e eventualmente também os longas. Artistas geralmente são vaidosos e individualistas, mas nunca me ocorreu que objetos, embora inanimados, pudessem ter sentimentos. Talvez seja a contaminação pelo contato e convivência. Se aquela discussão surgisse entre três artistas estrelados ainda seria compreensível, mas acho que minha imaginação anda muito fértil, ouvindo vozes e, o pior, responder a eles: uma bengala, um chapéu e um par de sapatos. Fechei os olhos e visualizei em minha mente os três objetos interagindo com ele, interpretando, criando, dançando, alegrando o público. Podia ouvir ao fundo Luzes da Ribalta. Abri os olhos e eles continuavam lá, estáticos, se exibindo orgulhosamente aos visitantes. 117