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LiteraLivre nº 9 – Maio/Jun de 2018
Ao lado, de uma pequena vitrine, ouvi outra voz: Não se deixe levar por
estes arrogantes. Eles não estiveram presentes em todos os filmes, mas eu sim.
Sempre estive calçado em seus pés, caindo fora uma ou outra vez, mas sempre
presente. Lembro que até quase fui comido, no desespero da fome do Klondike.
Eventualmente cheguei a ser substituído por patins, dadas às circunstâncias.
Imediatamente houve o revide: Este objeto rés-do-chão não tem nossa
beleza e apresentação. Acho que a última vez em que viu graxa foi na loja de
onde veio. Nós somos a nota aristocrática do nosso errático malandro.
Participamos ativamente das mais importantes cenas.
Voltei a falar baixo, para eles, sentindo-me um bobo: Mas vocês três foram
da maior importância na obra dele. São conhecidos mundialmente. Qualquer
pessoa do mundo ocidental que veja vocês três em conjunto identificará de quem
estamos falando.
Meu pensamento foi longe, lembrando o incontável número de vezes que
assisti a seus filmes todos. Quando eu era garoto, seus curtas já passavam na
televisão e eventualmente também os longas.
Artistas geralmente são vaidosos e individualistas, mas nunca me ocorreu
que objetos, embora inanimados, pudessem ter sentimentos. Talvez seja a
contaminação pelo contato e convivência.
Se aquela discussão surgisse entre três artistas estrelados ainda seria
compreensível, mas acho que minha imaginação anda muito fértil, ouvindo vozes
e, o pior, responder a eles: uma bengala, um chapéu e um par de sapatos.
Fechei os olhos e visualizei em minha mente os três objetos interagindo
com ele, interpretando, criando, dançando, alegrando o público. Podia ouvir ao
fundo Luzes da Ribalta.
Abri os olhos e eles continuavam lá, estáticos, se exibindo orgulhosamente
aos visitantes.
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