Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre 9ª edição | Page 121

LiteraLivre nº 9 – Maio/Jun de 2018 Relíquias Guilherme Hernandez Filho Santos/SP Quando entrei na grande casa branca, Manoir de Ban, em Corsier-sur- Vevey, senti imediatamente a alegre energia daquele que lá morou, com sua família, pelos últimos vinte e cinco anos de sua vida. Linda construção do século XVIII, cercada por bosques, jardins e hortas, com grandes varandas abertas, telhados sustentados por finas colunas brancas, algumas recobertas por trepadeiras floridas. Em seus salões, réplicas dos antigos estúdios, com cenas onde eram rodados seus filmes. Painéis e projeções digitais relembrando sua obra. Ao fundo suaves trilhas sonoras musicais. Protegidos por vitrines, cúpulas e armários, objetos de sua caracterização pessoal. Iluminados por um grande spot de luz, seus dois maiores símbolos, que tanto o marcaram, e que por si só já o identificam, expostos aos visitantes. Aproximei-me com incontida emoção. Aquela bengala de cana-da-índia, com cabo retorcido, sua companheira permanente. Junto dela o ruço chapéu coco, também típico da época, e com o que pretendia amenizar um pouco seu ar de vagabundo. Parei em frente a eles contemplativo. Aquilo era história. Naquele momento, ouvi a voz que me perguntou qual dos dois era mais importante. Pensei sobre a questão durante uns segundos antes de entender que ninguém falara comigo diretamente. Aquela pergunta surgira em meu cérebro, como que por transmissão de pensamento, telepatia. E então? Voltei a ouvir. Eu estava só, ali em frente, em verdadeiro êxtase. Olhei em minha volta e ninguém estava próximo. Ousei falar, bem baixinho, que ambos eram igualmente importantes e que tinham participado de quase toda criação do gênio. Me sentia meio idiota naquela situação. 116