LiteraLivre nº 3
menino escutou. Sim, estás. O besouro daqui é mais letal. Tudo aqui vai
ser visto por ti como quem é olhado por um enfermo. Aqui é o mundo
dentro do mundo. Aqui é o perto e o longe. Por isso, estás perdido. Mas
é assim perdido que se encontra o jardim, disse o menino, quase
sorrindo.
Quebra-me, salva-se, é a lei. E prossiga. Ele ouvia e não entendia.
Quis voltar, mas algo o paralisava. Nem olhar para trás ele conseguia. O
coração estava ligeiro, ele ouvia. E aquele som se confundia com um
tambor distante, que parecia que vinha, que se aproximava. O menino
fez um gesto de quem ouvia. Está ouvindo? O teu coração é quente, cai
bem para o estômago de um faminto. Quebra-me.
Sentiu-se preso. Aprisionado. A noite inteira era uma prisão.
Desapareceu a ideia do amanhecer. Era o mundo uma grande noite, e
ele precisava reagir. Deu um passo para trás. Pisou uma folha
barulhenta. O menino silenciou. Parecia algo esperar. Não aconteceu
nada. Deu outro passo para trás. As folhas eram o próprio chão. O
menino gritou. Um grito horripilante. Um salto de medo levou o homem
para trás de uma vez. Caiu. Quando levantou, o menino já estava caído.
Olhou ao redor. Nada. Ventava mais frio. Era um vento frio, muito frio.
Sentiu a sua pele fria. Foi até o menino jazido.
Morto. Ele estava morto, meu deus! O que faria? Olhou novamente
ao redor. Aquilo tinha que ser um pesadelo. Tocou. Estava tudo frio.
Chegou o medo. Quis fugir. Por impulso, correu. Se algo havia matado o
menino, poderia matá-lo também. Correu. Correu o mais rápido que
pôde. Sentiu o coração bater. Correu até sentir calor novamente. E
sentiu. Encontrou, sem procurar, a cidade outra vez. Saiu de um beco.
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