LiteraLivre nº 3
O RAIO-X
Gabriel Araujo dos Santos
Campinas/SP
Todas as vezes que preciso passar por um raio-x, me salta à
lembrança um acontecido na minha adolescência, num tempo em que se
amarrava cachorro com linguiça.
Trabalhava como contínuo na única agência bancária do
montanhoso lugarejo chamado Peçanha, lá nos confins das Gerais.
O gerente do Banco, Seu Aureliano, professor de música na
Escola Normal, figura de peso e de muito respeito, tinha assumido a
provedoria do Hospital Santo Antônio, também o único do lugar e da
região.
Incumbiu-me de atualizar o inventário de entrada e saída dos
pacientes do hospital, ditos indigentes, sem o que a instituição não
receberia as chamadas subvenções governamentais.
Bom datilógrafo que eu era, e ainda sou, não demorou muito
estava tudo em ordem. Mas não pensem que foi fácil! Não. Ainda mais
que o serviço era feito à noite durante a semana, e também após o
expediente de sábado e depois no domingo o dia inteiro.
No hospital não havia máquina de escrever, e tinha que levar
na cabeça, galgando as íngremes ladeiras, uma daquelas pesadonas, de
fabricação alemã, um nome difícil de lembrar, tão complicado era.
Desempenhei tão bem a tarefa, que as Irmãs Vicentinas,
administradoras da instituição, sempre que havia algo para fazer, logo
me requisitavam, e lá ia eu, contente por ser querido das religiosas. Um
privilégio até!
Certa feita, com a mudança para Belo Horizonte do médico
que era pau pra toda obra no hospital, o serviço de raio-x empacou de
vez, pois só ele e uma das Irmãs é que sabiam lidar com o aparelho. E
ela, a Irmã Vicença, mudara-se para uma cidade do interior de São
Paulo.
Seu Barbosa, quarentão, gordo e sistemático, um enfermeiro
prático, até que teve boa vontade de aprender a bater as chapas, mas
ninguém soube dizer onde andava o manual sobre como lidar com
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