LiteraLivre nº 3
críticos, atravessamos um viaduto e fomos finalmente despejados em
um terminal do doméstico, infelizmente o terminal errado...
Havia um mapa imenso em uma das paredes, para facilitar a vida dos
perdidos no labirinto. Bela tentativa, no meu caso, inútil. Meu cérebro
disléxico interpreta mapas às invertidas. Disléxicos travam sob tensão.
Os elevadores, por alguma sinistra intervenção, escondiam-se de
mim. O jeito era utilizar rampas e exercitar os braços ladeira abaixo ou
acima. A essa altura eu agradecia ao universo porque letras e números
são iguais em português e em inglês. Quando pensei ter chegado ao
destino final, encontrava-me diante do balcão de entrega de malas.
Depois de breve descanso, a brincadeira de "descubra seu portão"
recomeçou, sem as malas, felizmente.
Indicaram-se a direção B4, embora no painel eu lesse C7...eu em
francês, o outro em inglês, desconversamos em um mapa, rascunhado
com um "x" que deduzir marcar o local de nosso embarque.
Não era no B nem no C e quando descobri isso eu já emagrecera
alguns quilos, perdera a cor e a voz. Um anjo jogou em meu caminho
outro brasileiro tão perdido quanto eu, mas com a vantagem de falar
inglês.
Um guarda impaciente, aos gritos de "go! go!" apontou um túnel
adiante. Corremos loucamente, o rapaz, eu e as crianças.
Fomos encontrados por uma perua, vazia, a buscar pelos
retardatários: nós
Fui o último a entrar no avião, sem direito a banheiro, lanches,
compras, nada.
As crianças me olhavam caladas, em um misto de decepção e
piedade pelo pai desalojado do pódio. Consolaram-,me com beijos
molhados e acariciavam meu rosto com mãozinhas trêmulas, a repetir
como um mantra "está tudo bem".
A vida é impiedosa. A próxima viagem, onde eu ingenuamente
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