Relatório da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2015 | Page 79
78 | RELATÓRIO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA DA ALERJ | 2015
como recentemente aconteceu no Morro da Providência, pois é quando a ação policial
é individualizada a partir da prova.
A Polícia no Rio de Janeiro não conclui 83% das investigações de homicídios praticados por policiais. Cerca de 98% dos casos de auto de resistência são arquivados pelo
Ministério Público. Segundo informações publicadas no relatório “Você matou meu
filho”, da Anistia Internacional, das 220 investigações sobre homicídios decorrentes
de ações policiais na cidade do Rio em 2011, 183 ainda não haviam sido concluídas até
abril de 2015.
O chefe da Polícia Civil, Fernando Veloso, reconheceu, durante audiência na CPI dos
Autos de Resistência2 da Assembleia Legislativa, que a falta de investimentos em pessoal e tecnologia para investigar homicídios provocados por operações policiais resulta na falta de produção de informações qualificadas sobre o assunto.
CICLOS DE VIOLÊNCIA
Se parte dos policiais são os autores de crimes responsáveis pelos altos índices de violência, uma preocupante parcela também é vítima. Até outubro de 2015, mais de 66
policiais foram mortos no Rio de Janeiro. Segundo o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Rio é o estado campeão de mortes de agentes de segurança. Em 2014,
2. A CPI de Autos de Resistência
e Mortes decorrentes de
Ações Policiais no Estado da
Assembleia Legislativa do
Estado do Rio de Janeiro, teve
sua criação publicada em diário
oficial em 9 de outubro de
2015. A comissão é presidida
pelo deputado estadual
Rogério Lisboa e com relatoria
de Marcelo Freixo. A proposta
busca investigar o baixo índice
de resolução nos casos de
autos de resistência.
foram 98 policiais assassinados, quase 25% dos 398 agentes mortos em todo o país.
3. ZACCONE, Orlando.
Acionistas do Nada: quem
são os traficantes de drogas.
Rio de Janeiro: REVAN, 2007.
A expressão “acionistas do
nada” é uma denominação
cunhada por Nils Chistie, na
obra “A indústria do controle
do crime” para conceituar a
seletividade produzida pelo
sistema de governos e jurídicos
em relação às pessoas que
O “mata-mata” é a parte visível da violência fomentada por uma política de enfrenta-
são atingidas pela prática da
conduta descrita como tráfico
de substância entorpecente
como algo irrefutável.
Este percentual é maior para homens (52%); moradores da região Sul do país (54%);
e autodeclarados brancos (53%). Por outro lado, 45% da população discordam dessa
afirmação. E essa discordância é formada proporcionalmente mais por mulheres, au-
“A polícia que mata é a mesma polícia que morre. E nenhuma polícia no Brasil morre
no nível da polícia do Rio de Janeiro. Nós temos ciclos de vingança que consistem
em: criminosos executados pela polícia em serviço e, posteriormente, temos policiais
executados por criminosos, principalmente quando estão de folga. A barbárie que vai
é a mesma barbárie que volta e assim nós temos esses casos terríveis de policiais que
são arrastados até a morte, como aconteceu recentemente no Rio de Janeiro. Portanto, os policiais não são os beneficiários deste sistema perverso e de falta do controle
do uso da força. Eles são também vítimas dessa conspiração do silêncio”, destacou o
sociólogo Ignácio Cano, na CPI de Autos de Resistência da Alerj.
mento direto ao tráfico de drogas, promotora do princípio do bem e do mal como dispositivo da construção de realidade social. Isso se expressa na “guerra” dos bandidos
contra os mocinhos, de vilões contra heróis, dos “acionistas do nada”3 contra os pacificadores, que torna todos reféns e vitimiza a população. Esse panorama histórico-social, somado aos consensos construídos discursivamente pela mídia, tem projetado
um imaginário social de tensão e constante conflito no Brasil.
Segundo pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 50% dos residentes nas
grandes cidades brasileiras concordam com a frase “Bandido bom é bandido morto”.