Relatório anual da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2014 | Page 67
O jurista Salo de Carvalho chama de ideologia da diferenciação o fato de a norma penal produzir tratamento distinto para usuários e traficantes, sendo o primeiro doente
e o segundo, delinquente:
8. MALAGUTI, Vera. Difíceis
ganhos fáceis: drogas e
juventude pobre no Rio de
Janeiro. Instituto Carioca
de Criminologia. Coleção
Pensamento Criminológico:
Volume 2. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1998.
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Neste incipiente momento de criação
de instrumentos totalizantes de repressão, o modelo médico-sanitáriojurídico de controle dos sujeitos envolvidos com drogas, fundado duplo
discurso que estabelecerá a ideologia
da diferenciação. A principal característica deste discurso é traçar nítida
distinção entre consumidor e traficante, ou seja, entre doente e delinquente, respectivamente. Assim, sobre os
culpados (traficantes) recairia o discurso jurídico penal do qual se extrai
o estereótipo do criminoso corruptor
da moral e da saúde pública. Sobre o
consumidor incidiria o discurso médico-psiquiátrico. (2013, v.6, p. 65)
No entendimento da política criminal de
drogas a segregação da detenção para negros era mais reeducadora do que a permanência na escola. Para o branco, o atestado
médico, assegurava a reeducação com a família. Sob a égide do confinamento e do extermínio, o sistema penitenciário brasileiro
transforma a prisão de castigo em remédio.
A ilusão ressocializadora mascara a crueldade dos processos de “regeneração8”. Assim,
compreende-se que no contexto no qual se
inserem as ocorrências no Estado do Rio de
Janeiro em relação à juventude negra, não
se adequam a vontade da carta magna, não
estando de acordo com o previsto no texto
da Constituição.