Relatório anual da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2014 | Page 52
de esquerda que começaram com algumas
políticas sociais nos governos do Fernando
Henrique, do Presidente Lula e que seguem
uma linha ascendente no atual governo da
Presidenta Dilma apresentam similaridades
incapazes de enfrentar a luta ideológica
enraizada daqueles que como nos ensinou
Vitor Nunes Leal são os coronéis donos das
enxadas e dos votos. Não fosse assim os defensores da ditadura não teriam sido eleitos
com milhares de votos na última eleição.
Se atentarmos para as reformas de base
propostas pelo Presidente João Goulart no
Comício da Central do Brasil em 13 de março de 1964, as quais mexeriam com a estrutura fundiária e econômica em nosso país,
algo até hoje não realizado, entenderemos
que o modelo administrativo e político do
nosso país se orienta, ainda atualmente,
pelo interesse da classe dominante, independente de quem seja essa classe. É por
isso que, apesar das eleições livres e regulares, milhares de pessoas foram às ruas em
2013 para reivindicar direitos e enfrentar
uma crise de representatividade. Ou alguém
acha normal que mais de 50% da população seja formada por mulheres e elas ocupem apenas 8% das cadeiras no Congresso
Nacional?
Nenhum governo, desde o fim da ditadura, poupou o uso da violência para reprimir
lutas sociais, embora a intensidade tenha
sido diferenciada, conforme os interesses
econômicos.
Não há dúvidas de que a democracia é sempre melhor que qualquer ditadura e como
disse a Presidenta Dilma durante a última
campanha eleitoral não podemos esquecer
que para quem viveu a ditadura ela está ali
na esquina. Não temos o direito de tapar o
sol com peneira e deixar de enfrentar esse
modelo que permite até hoje o controle dos
ricos sobre a economia e a política, submetendo os pobres a políticas compensatórias,
quando todas as políticas devem ser reparatórias. Devemos comemorar as políticas
dos governos Lula e Dilma que retiraram
quase 40 milhões da pobreza, mas o que
fazer com os 16 milhões que ainda vivem
na extrema pobreza?
Tudo o que nos toca e move diante dos
problemas estruturais de moradia, acesso
à saúde, transporte público, distribuição de
renda, acesso à educação está intimamente
ligado com esse passado que não passou
porque a ditadura, assim como a escravidão
foi um negócio: deu lucro. O que não pode-
mos é permitir que a democracia também
seja um negócio e cabe a cada um de nós
lutar todos os dias contra isso. É óbvio que
esses 30 anos de democracia trouxeram
conquistas na área da educação, da saúde, do emprego, da qualidade e expectativa
de vida, mas infelizmente os que têm mais
continuam com mais, independente daqueles que tinham menos e hoje possuem um
pouco mais. Não sejamos ingênuos, continuamos s ujeitos a um conjunto de medidas
políticas e econômicas gestadas na ditadura
que permanecem intocadas quando se trata da real distribuição do poder econômico
que nada mais faz além de fomentar a injustiça social.
Estudar o período da ditadura e investigar
as atrocidades cometidas nos ajuda a compreender o motivo dos pobres e excluídos
de hoje serem torturados nos moldes do
que fizeram com os “terroristas” ou “subversivos” que simplesmente desapareceram
não apenas para seus familiares, mas para a
história do país.
É contra esse esquecimento e essas ausências que pautamos nosso trabalho na Comissão da Verdade do Rio. Isso nos conduz
à certeza de que o golpe militar de 1964 foi
antidemocrático, mas a ruptura com o modelo de encarcerar pobres e excluídos ainda
não ocorreu. Não fosse assim a população
carcerária em nosso país não seria a maior
de todos os tempos.
Será que, seja há diferença entre matar, torturar, desaparecer, condenar pela mídia antes de julgar na ditadura e na democracia?
Enquanto não rompermos com as estruturas que concentram o poder econômico e
político nas mãos dos mesmos de sempre
estaremos apenas reproduzindo o mesmo
modelo das capitanias hereditárias.
Infelizmente a atual composição do Congresso Nacional, somada a decisão equivocada do STF de não revisar a Lei da Anistia,
fato que permitiu aos próprios torturadores
se anistiarem, são bons exemplos de que a
essência não mudou. Se por um acaso alguém defender que mudou, nos resta perguntar o motivo de não ter mudado para
quem vive em áreas dominadas pela milícia ou pela polícia que arrasta corpos pelas
ruas, ou àqueles que moram nas ruas, em
sua maioria negros.
Nosso trabalho na Comissão da Verdade
tem vários objetivos previstos em lei, mas
somos movidos pela convicção que enquan51