RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA Resumo Executivo | Page 23

às drogas pautada na repressão violenta nas favelas e periferias ao varejo do tráfico, a questão das drogas se tornou o motivo legitimador - legalmente e so- cialmente - do hiperencarceramento e do extermínio da população negra, espe- cialmente da juventude negra. Em todas as histórias escutadas, uma coisa resta nítida: o outro lado das execuções e dos desaparecimentos forçados cometidos pelo Estado é o encarceramento em massa. O superencarceramento - a superlotação dele decorrente - e suas consequên- cias, tanto no sistema prisional quanto no sistema socioeducativo, no que se refere à garantia dos direitos básicos do presos e à garantia de um tratamento adequado dos agentes em relação às pessoas privadas de liberdade, são pro- blemas centrais a serem enfrentados no presente. A superlotação implica na completa deterioração das estruturas das prisões e das unidades do DEGASE - que na atualidade, como foi muitas vezes afirmado, em nada se diferenciam do sistema prisional - ocasionando a inadequação total desses espaços para a custódia de seres humanos. Todas as unidades enfrentam, em diferentes níveis, graves problemas no que tange ao fornecimento de insumos básicos de higiene e vestuário; à garantia de alimentação adequada; ao atendimento à saúde e ao fornecimento de medicação; à garantia de prestação jurisdicional célere e efeti- va; ao transporte adequado dos presos, presas e jovens privados de liberdade; ao tratamento conferido pelos agentes aos presos; entre tantas outras questões. Outro ponto abordado frequentemente durante a pesquisa, e que se relaciona intimamente com o problema da superlotação, se refere a utilização irrestrita do instituto da prisão provisória. Atualmente, em torno de 40% da população do sistema prisional é composta por presos sujeitos a esse regime. Foi relatado em diferentes testemunhos que a prisão provisória se converte - na prática - em um período de tempo extremamente longo e, portanto, violador dos direitos dos presos e presas. Ademais, como os espaços para o acautelamento de presos provisórios não possuem os requisitos exigidos pela Lei de Execução Penal (LEP) para o cum- primento de penas definitivas, tal condição é ainda mais violadora de direitos. O que a gente tem é que, no processo penal, deveria ser uma ex- ceção a prisão processual, a prisão provisória, a prisão cautelar. Mas a gente vê que não é bem isso, que cada vez mais a gen- te tem a regra as pessoas responderem pelo processo presas, e a exceção é que ela responda o processo em liberdade. Diante disso, hoje pesquisas já apontam que 40%, mais ou menos, dos presos do sistema são presos provisórios, ou seja, presos que não têm a sua situação jurídica definitiva. (...) Então a situação do pre- so provisório hoje é talvez a pior situação que existe, porque além de estar em uma quantidade absurda – a gente está falando de um universo de dezesseis, dezessete mil pessoas –, eles ficam em unidades que não foram pensadas para receber gente durante muito tempo. E infelizmente, a gente encontra pessoas em cadeias públicas há mais de um ano, há mais de seis, sete, oito meses. (Testemunho João Gustavo) O Brasil é o país com a terceira maior população carcerária do mundo e o aumen- to da taxa de encarceramento nas últimas décadas não teve qualquer impacto na redução da violência. Pelo contrário, vivemos um cenário de agravamento desta. Afirmamos aqui, enquanto órgão do Estado, a preocupação e a total dis- cordância em relação a qualquer política que implique em práticas ainda mais reiteradas de encarceramento. Nesse cenário, destacamos nossa contrariedade 23