RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA AS EXECUÇÕES SUMÁRIAS NO RJ | Page 14

Rupturas e transições O primeiro grande ato de ruptura de Leonel Brizola com o modelo autoritário vigente até então foi a dissolução da Secretaria de Segurança Pública [SSP]. Essa opção se deu em virtude da subordinação do órgão às Forças Armadas, que controlou, por meio dos generais do Exército, a segurança no estado durante quase toda a sua história. Pra se ter uma ideia acerca da profundidade de tal transformação na organização das polícias no Rio de Janeiro, em 166 anos de existência da Polícia Militar, apenas em 12 ela foi comandada por um membro da corporação. Em paralelo à extinção da SSP, Brizola desmembra as forças de segurança e às coloca, com o status de Secretaria, sob a chefia de representantes das corporações. Para isso cria a Secretaria de Polícia Civil, a cargo do delegado Arnaldo Campana – que se destacou na investigação de chacinas durante a gestão Chagas Freitas – e a Secretaria de Polícia Militar, sob o comando do Coronel Nazareth Cerqueira – negro, erudito, humanista e respeitado pela Polícia Militar. Cerqueira era um defensor dos direitos humanos e também um especialista em segurança pública, entusiasta dos modelos mais modernos de policiamento com que travou contato em seus intercâmbios e cursos de aperfeiçoamento. Na histórica publicação do Plano Diretor da PMERJ 1983-86, os ideais de uma polícia cidadã são transmitidos à tropa e à população pelo coronel Cerqueira: A mudança de conduta do Governo em relação à comunidade deve começar pelo respeito aos direitos humanos em todos os níveis, particularmente no que diz respeito à segurança do cidadão comum. É necessário criar junto à população a consciência do fim da arbitrariedade e da impunidade, no que diz respeito às autoridades estaduais. O cidadão não deve temer a polícia, que será acionada para protegê-lo, e não para reprimi-lo. Não haverá prisões sem flagrante delito e não se entra nas favelas arrombando portas de barracos, mas, ao contrário, a nova administração vem tentando atuar em colaboração com a comunidade. A manutenção da ordem pública se fará através do policiamento preventivo, do diálogo e da ação política, e o governo garante ao cidadão o direito de se manifestar livremente [Plano Diretor da PMERJ 1983-86. Imprensa da PMERJ, ed. de abril de 1986, p. 9. In Arquivo do Instituto Carioca de Criminologia]. A mudança nos padrões da atividade policial descrita no plano diretor se deu em vários níveis. Nas ruas, as incursões nas favelas foram proibidas, assim como as blitz, abordagens arbitrárias, prisões para averiguação e “vadiagem”, além das invasões aos