PODERES EM REVISTA 4ª edição | Page 86

história i saveiros A inda hoje, entidades de mais de 400 anos insistem em continuar singrando os mares da Bahia. Parecem não se mover apenas pela força dos ventos. Os próprios navegadores as tratam como seres animados, vivos, cheios de alma. “O saveiro não gostou dessa vela, não. O saveiro não gostou disso, não gostou daquilo”, costumam dizer. Mas as águas calmas da Baía de Todos-os-Santos, em Salvador e em toda a região do Recôncavo, quase perdem as tradicionais velas brancas, que, desde os primeiros anos do século XVII, dançam ao sabor do seu movi mento sereno. Não faz muito tempo, os saveiros vela de içar passaram a navegar vazios e chegaram bem perto da morte (ver box na página 88). Genuinamente baianos, pelo menos na forma que tomaram para adaptar-se à navegação local, foram do auge à decadência em poucas décadas. Dos mais de 1,5 mil barcos existentes no século passado, restam 18. A extinção só não aconteceu graças ao amor quase transcendental de um grupo de apaixonados pelo mar. A Associação Viva Saveiro, criada por oito amigos, em 2008, conseguiu manter os barcos em plena atividade. Passaram a adotar as velhas embarcações e, com dinheiro próprio, a comprar os saveiros para devolvê-los novos em folha aos mestres, após minucioso trabalho de engenharia naval e de carpintaria. É o patrimônio redivivo voltando para de onde nunca deveria ter saído. “Uma parte importante da nossa história estava morrendo em silêncio nos manguezais da Baía de Todos-os-Santos”, diz o empresário Roberto Bezerra, o Malaca, um dos 86 I Poderes em Revista abnegados e vice-presidente da Viva Saveiro. Todos os anos, a associação também realiza a Semana do Saveiro, com exposições de fotografias e obras de arte. E há um projeto de construção do museu. O artista plástico Bel Borba, conhecido por imprimir mosaicos de azulejos e dezenas de esculturas por toda a Salvador, também tira dinheiro do próprio bolso para restaurar a vida dos ‘saveirões’. Paga para deixar em boas condições lemes, mastros, velas e cascos. “Depois que passei a entender por que os mestres tratam os barcos como seres vivos, divulgo da maneira que posso”, afirma ele, autor de uma exposição sobre o tema. O dinheiro arrecadado com a venda das obras foi revertido para a associação. “Quando você vê o saveiro todo quebrado ou queimado, parece a carcaça de um regatas: eventos promovidos para garantir a sobrevivência dos saveiros na baía o 15 de agosto, antes da restauração: Associação Viva Saveiro em uma de suas primeiras ações