imagem e reputação
Mário Rosa
Jurisprudência Dieckmann/Cabral
D
urante muitas e muitas décadas, gerações e
gerações compartilharam, ao redor do mundo,
um mesmo tipo de passatempo: escrever diários
pessoais em que podiam registrar para a posteridade
flagrantes de intimidade, reminiscências, reflexões.
Naquele mundo analógico que existiu até bem pouco
tempo atrás, era possível manter protegidas do mundo
as nossas contradições, os nossos dilemas, as nossas
questões inconfessáveis. Para isso, bastava depositar o
“querido diário” numa caixa, numa gaveta, no fundo
do armário – e pronto. Nosso mundo interior estaria a
salvo da fornalha que é a curiosidade humana, capaz de
incinerar, de maneira fulminante, qualquer deslize alheio.
A lembrança dos “queridos diários” é mais do que
oportuna nesses dias em que assistimos a eventos da
esfera da intimidade ganharem destaque no noticiário.
Especificamente, dois casos recentes despertaram uma
enorme repercussão. Embora situados em campos distintos do universo social, ambos os episódios guardam
uma perturbante similaridade. Primeiramente, vieram
a público imagens de festas animadas em Paris, em que
apareceu o governador do Rio, Sergio Cabral. As cenas,
registradas em celulares e câmeras por um dos presentes,
foram subtraídas do computador de uma das pessoas
que participaram dos festejos, e, lançadas na internet,
alcançaram enorme visibilidade. Noutro caso, foi a vez
da atriz Carolina Dieckmann: imagens de sua intimidade
(também de celular e câmera) foram retiradas de seu computador, sem seu conhecimento, e ganharam o mundo. A
atriz entrou com processo na Justiça para reparar o dano
e buscar punição para os responsáveis.
Dois episódios, duas personalidades públicas, dois
enredos distintos, mas um questionamento crucial em
comum: é preciso agir de maneira preventiva, no que
tange à intimidade, quando se é uma pessoa pública?
Sempre se soube que os códigos sociais impõem um determinado protocolo a líderes e pessoas com posições de
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destaque. Mas esses mesmos cânones devem ser levados
à intimidade, de maneira quase paranóica? Em última
instância, não seria uma distorção seguir diretrizes pautadas pela ótica pública na vida pessoal, nos momentos
de descontração, na esfera da privacidade?
Esses questionamentos se revestem de grande importância, sobretudo quando envolvem os operadores do
redes sociais: diários pessoais da era virtual