Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 7º Volume | Page 30

Discussão

“Eu perdia a linha muito fácil, não dava. Aí já tava com problema, aí já juntava com outro problema entendeu? Eu até cheguei a tomar uns remédio controlado porque eu era muito ansioso.”

Neste primeiro trecho de fala de um dos adolescentes entrevistados podemos por em relevo algumas questões. A primeira nos faz atentar para a possibilidade de estarmos diante de um adolescente que escapasse aos instrumentos institucionais de controle dos corpos e comportamentos, quando se diz “perder a linha muito rápido”.

O breve histórico que procuramos apresentar pode nos dar subsídios para pensar a repetição de uma prática, ou seja, encaminhar para nomear (diagnosticar) e medicar o comportamento incontrolável.

A importância em olhar para esta fala e refletir a partir dela sobre a prática e responsabilidade neste contexto está na atenção para a linha tênue que se estabelece entre uma ação de cuidado e uma ação patologizante, e a repetição de uma lógica de exclusão e de individualização de conduta, descaracterizando integralmente os encargos das instituições e da própria esfera social, naturalizando a responsabilização individual.

Vicentin, Gramkow e Matsumoto, (2010) chamam a atenção para esta prática patologizante, identificando-a como contenção química, ou seja, quando o uso do medicamento serve ao propósito institucional, de controlar o comportamento dos adolescentes. Discutem, ainda, sobre um de seus possíveis desfechos que é a interdição do adolescente. Seu encaminhamento para internações compulsórias, determinada judicialmente, embasada nos subsídios de natureza psi, sob argumentações que repousam no tema da saúde mental.

A legitimação desta conduta pode ser percebida com o surgimento, em 18/12/2006, da Unidade Experimental de Saúde (UES), órgão de responsabilidade dividida entre as parcerias das Secretarias da justiça, Saúde e da Administração Penitenciária. Para a referida Unidade são encaminhados, compulsoriamente, os adolescentes diagnosticados com transtornos de personalidade, associados a alta periculosidade. O tratamento/contenção não tem prazo máximo para ser concluído, portanto o tempo de privação de liberdade será administrado, assim com eram nos hospitais de custódia, popularmente conhecidos como manicômios judiciários, desarticulado do que estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente, sobre o tempo máximo para a medida socioeducativa de internação de 3 anos. (Vicentin, Gramkow e Matsumoto, 2010).

PATHOS / V. 07, n.04, 2018 29

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