Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 6º Volume | Page 56

Os zumbidos que saem dos ouvidos ao invés de entrar podem indicar sua aversão ao desejo dentro de si e uma possível tentativa de externalizar e depositar o que é seu no que vem de fora, o que se assemelha ao outro sintoma: a tosse que poderia também ser uma tentativa de expelir o que supostamente não a pertence e que não consegue expressar através da linguagem, mas que o corpo responde, como a gota gelada que sai da cabeça e escorre pelo corpo, ou seja, as ideias angustiantes de sua mente que se tornam sintomas corporais.

Como abordado por Castiell et al. (2012), a conversão vem em resposta, a um deslocamento do afeto a uma intervenção somática, de forma a produzir um esquecimento da ideia original, sem extingui-la, o que justificaria a formação dos sintomas histéricos. Estes sintomas falam por Clarice, tentam de maneira patológica exaurir um desejo que grita em seu mais profundo inconsciente e que luta para sair por vias somáticas, que lhe causam angústia e mal estar psíquico.

A falta está no outro: Desde o início evita responsabilizar-se por si mesma como quando informa: “meus filhos são meu único problema” [sic] ou quando cita sobre os atendimentos de outra estagiária como forma de anular a minha presença e apontar a minha suposta falha em não dar conta do suposto saber sobre ela.

Chega a dizer que teve uma gravidez indesejada devido ao anticoncepcional: “eu nunca tive uma relação muito boa com o anticoncepcional... Sempre me esquecia de tomar, foi assim que acabei engravidando. [sic] ou quando se refere a uma falta a sessão devido a ter ajudado a irmã com assuntos judiciais: “hoje eu estou bem, desculpa ter faltado, mas foi por causa de problema dos outros” [sic].

Clarice irá agir como se a falta estivesse fora de si, ou seja, no outro, como quando descreve: "Certa vez, a “L” (filha de Clarice) não fez nada, nem uma janta, eu chego em casa com fome de comida de sal. Parece que se não como uma carne, um arroz, por mais que eu tenha lanchado, algo me falta" [sic].

Neste momento eu pergunto se ela consegue lembrar-se de alguma outra situação que algo lhe faltou. Ela pensa e em poucos segundos diz: "companhia" [sic], mas completa: “sabe, meu filho tem a mulher dele, meu irmão tem minha cunhada e minha irmã, o marido dela, só eu que não tenho ninguém...[sic]. Clarice faz uma pausa, pensa mais uma vez e fala: "também sinto muita falta da minha mãe, do carinho dela" [sic].

PATHOS / V. 06, n.04, 2018 55

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