O queijo de coalho em Pernambuco: histórias e memórias | Page 44
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O QUEIJO DE COALHO EM PERNAMBUCO: HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
Para Darcy Ribeiro39:
A pecuária acompanhava uma tímida lavoura de subsistência, praticada nas vazantes ou nas matas
ciliares que bordejavam os cursos
d’água permanentes. Tal atividade
fornecia ao sertanejo um mínimo de
produtos agrícolas indispensáveis a
sua manutenção e a dos animais de
transporte no caso da mandioca, do
milho, feijão e da cana. Eram diminutas em extensão, visto que as
roças individuais dificilmente ultrapassavam a área de um hectare,
em que, geralmente, só se plantava
uma vez.
Portanto, variadas implicações foram percebidas pelo trajeto do gado Sertão adentro, que permitiam a comercialização de vários produtos relacionados
à criação do animal e que atendiam, modestamente, a quem vivia em função disso. Todo esse caminho percorrido pelo
gado possibilitou o descortinamento de
novas áreas a serem povoadas e de territórios a serem mapeados. Territórios
que, até então, eram conhecidos, mas
assustadoramente temidos. Não dá para
perder de vista a medida da ampliação
do território colonial e as mudanças
que seriam advindas com a pecuária nas
implicações à sociedade luso-brasileira.
Uma dessas implicações foi a facilitação
do comércio do trabalho escravo junto à
agricultura de exportação.
Ressaltam-se, por Alencastro40, as situações que o caminho do gado proporcionou, além das descobertas de novas
regiões que permitiram uma significati-
va mudança nos espaços geográficos da
capitania de Pernambuco e facilitaram
o comércio do trabalho escravo na agricultura de exportação, enriquecendo
mais ainda a região, de maneira que
contraditoriamente se vem ainda a perceber que:
[...] A atividade pastoril dá origem as relações de produção que se
apartavam do escravismo. A tênue
presença de capital mercantil, a
natureza do processo produtivo e a
ausência de controle direto do proprietário reduziram o impacto do
sistema escravista no Sertão, ainda
que a presença de escravos negros
possa ter sido importante nas fazendas de gado. Criadores pagando
reses como renda aos proprietários
das terras, a vaqueiros assalariados
para o campeio e transporte das
boiadas, ‘brancos’, mulatos e pretos, e também índios que com este
trabalho procuraram ter algum
lucro (Antonil) – engendram uma
camada social do engenho. Ponto
de fuga do escravismo, a pecuária
estende a ocupação e o enquadramento do território41.
Para muitos historiadores a retirada
do gado para o Sertão deu aos escravos
fugidos a tão sonhada liberdade. Essa
apregoada liberdade que somente foi
possível graças ao trajeto do gado, também auxiliando que pessoas de várias
etnias pudessem trabalhar em prol da
mesma função.
Quando referimo-nos ao tipo de
gado genericamente introduzido no Ser-
"... a retirada do gado para o Sertão deu aos
escravos fugidos a tão sonhada liberdade. Essa
apregoada liberdade que somente foi possível
graças ao trajeto do gado, também auxiliando
que pessoas de várias etnias pudessem trabalhar
em prol da mesma função."