O queijo de coalho em Pernambuco: histórias e memórias | Page 100
98
O QUEIJO DE COALHO EM PERNAMBUCO: HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
5.1.1. A Memória no interior do Estado
ENTREVISTAS DE PRODUTORES DE QUEIJO
Nome:
Manoel Dantas de Melo (Tio Né ou ainda
Candeeiro)90
Esposa: Lindinalva Paes Loiola
Buíque - PE
Foto: Sonia Carvalho
Com quem o sr aprendeu fazer queijo
de coalho?
_ Eu nunca fiz queijo de coalho,
quem fazia era minha irmã Maria José,
botava o coalho dentro (do leite) de
bode. Vendia a um velho que levava
para os Agrestes de Garanhuns, Farinha
...
Botava numa tabuinha e ele vinha
com oito dias. Todo dia fazia, a sobra do
leite, botava para coalhar e fazia pequenininho não dava nem meio quilo, eu
era pequeno, hoje tenho 92 anos, nasci
em 1914.
Na época de Lampião (fez parte
do bando era conhecido pelo cognome
Candeeiro) quando não tinha carne
mandava buscar queijo. Comia queijo
com rapadura, farinha... Faltou carne,
aí levou dez quilos (de queijo de coalho)
como era muita gente num instante acabou... Foi até descoberto isso. Fazendeiro quando chegou volante de Alagoas,
ele que viu, disse: “_veio camarada aqui
comprou dez quilos de queijo ele não
é queijeiro”. Aí fomos descoberto (sic)
onde nós estávamos só fizeram o rio e
cercaram a gente a noite, foi uma coisa...Cinqüenta e nove e tantos soldados,
levaram metralhadora, duas grandes, e
cercaram a gente... Nós havíamos passado até nove da noite conversando, estava com três dias que a gente estava lá
em Angico, aí Ele (Lampião) disse assim:
”amanhã vocês vão levantar cedo que é
pra tratar de sair daqui..”_ olhe, já estava cercado. Aí terminou a conversa,
dormi de bruços, dormi mais outro, Chá
Preto. Ele chamou os meninos para buscar leite, tinha uma fazenda que ficava a
dois quilômetros, ou era três? Pra desmama. Naquele tempo, não é como aqui
não, tratava as vacas soltas dentro da
Caatinga, fazia a casa dentro dos matos,
aqui os fazendeiros tem cocheira tem
tudo, lá naquele tempo não tinha não,
no sertão não tinha cocheira não tinha
nada tirava o leite ali e soltava as vacas
dentro do mato da Caatinga. Pra chamar os bichos vinha buscar duas latas, aí
saia batendo...
COMENTÁRIO
Tio Né como é conhecido o Sr Manoel Dantas, não foi fabricante de queijo, fez parte do bando de Lampião e
conta que sua irmã o fabricava para comercializar, e sabe detalhar a maneira
do fazer, desde o processo de acumular
e armazenar a produção e até a forma
de comercialização.
Durante a estada com o bando de
Lampião o queijo era muito utilizado
como substituto da carne (proteína substituindo proteína), e ainda como acompanhante da rapadura e de farinha. O
mesmo afirma que quem comercializava
queijos era queijeiro.