A sucessão e o novo espírito do tempo
Luiz Werneck Vianna
A
política brasileira encontra-se criptografada, indecifrável
para os mortais comuns, que a cada dia são aturdidos
pelos meios de comunicação com notícias de que o fim do
nosso mundo está próximo e não há o que fazer para salvá-lo do
pântano da corrupção em que estaria atolado.
Nossos profetas do apocalipse são prisioneiros de suas fabula-
ções sobre a História do país, que identificam como um experi-
mento malsucedido a ser “passado a limpo” por sua intervenção
redentora. Querem nos fazer crer que atuam em nome de ideais e
sem interesse próprio, mas o gato está escondido com o rabo de
fora, pois em meio à alaúza que provocam se pode entrever a
manipulação da sucessão presidencial de 2018.
Esta sucessão abre uma janela de oportunidades para uma
agenda inovadora que procure, em meio a um amplo processo de
deliberação pública, identificar novos rumos legitimados pelo voto
para o país. No entanto, caso se frustre esse caminho por desas-
tradas ações dos agentes políticos, pode apontar para o derrui-
mento do regime da Carta de 88, concedendo passagem às potên-
cias malignas que ora nos espreitam. O cenário que se tem pela
frente, é forçoso reconhecer, não favorece previsões de desenlaces
felizes para os dilemas com que ora nos confrontamos.
Aqui, ao que parece, Maquiavel foi banido do nosso repertório
político desde o advento da Operação Lava-Jato, há três anos
presença dominante na conjuntura sem que, salvo exceções, a
copiosa literatura que lhe é dedicada leve em conta as circunstân-
cias que envolvem as ações dos atores e dos fins que erratica-
mente perseguem.
Desarmados de suas lições, anacronicamente recuamos ao
medievo, atribuindo-se – “maquiavelicamente”? – precedência dos
valores da moralidade sobre a razão política. Ignora-se que o
realismo político que Maquiavel preconizava estava a serviço de
um ideal cívico, qual seja o de criar na Itália um Estado capaz de
livrá-la da dominação estrangeira.
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