O imprevisível 2018 PD49 | Page 27

na competição política nem se oferecem ideias e propostas subs- tantivas claras aos cidadãos. A democracia alimenta-se do conflito. Polarizações não somente são inevitáveis, como ajudam a manter a temperatura política no limite do suportável e a explicitar diferenças que pulsam no terreno social. Acontece que uma multiplicidade de polos não é uma virtude. Pode mesmo funcionar para impedir a plena manifestação dos polos “verdadeiros”, aqueles que carregam no ventre os interesses fundamentais da sociedade, as contradições principais. Divisões artificiais e pouca disposição para o diálogo terminam por criar campos ideológicos antípodas, soltos no ar, sem pé na realidade. Parte-se da ideia de que a sociedade é mais dividida do que se vê, e com isso criam-se divisões por sobre divisões. A intolerância cresce, as tensões tornam-se insuperáveis e provocam rupturas. Esfuma-se assim o que poderia haver de virtude nas polariza- ções. O antagonismo criador esfria, sendo substituído por atritos sem perspectiva de consenso. O Brasil dos últimos anos esteve condicionado pela polariza- ção PT vs. PSDB. Tamanha foi sua força que a sociedade se deixou encantar com o que se anunciou como sendo duas matrizes de governança e de projeto nacional. Nem petistas, nem tucanos, porém, conseguiram se firmar como forças dotadas de densidade programática e vocação hegemônica. Foram se desconstruindo ao longo do tempo, e chegaram hoje ao ponto mais baixo de sua trajetória. A sociedade, por sua vez, foi-se saturando com a reite- ração daquela polarização, roubando-lhe chances de reposição. Polarizações podem funcionar como fatores de organização, nos quais o antagonismo qualifica o quadro geral. Nem sempre os polos estão fechados para entendimentos e composições. Podem conviver no interior de polos maiores e convergir para um patamar comum. É o segredo da unidade democrática, que é feita de soldagens dialó- gicas, e não impositivas, entre correntes distintas. A política sofre quando não dispõe de patamares unificadores, que possibilitem o diálogo entre campos distintos. Afasta-se dos cidadãos, assiste à apresentação de propostas diversionistas e ao surgimento de candidaturas voluntaristas ou regressistas. No Brasil atual, as forças democráticas enfrentam dificuldades para romper os círculos que estreitam sua movimentação e impe- dem sua reposição vigorosa na cena nacional. Precisam recusar o O centro, a esquerda democrática e o novo como fetiche 25