popular, com todo o sistema de crenças, superstições etc. E encon-
trou a chave para unificar, criticamente, essas duas instâncias.
Resolveu a questão de maneira muito original. Estabeleceu uma
relação entre a passagem do saber ao compreender e ao sentir, e, ao
mesmo tempo e inversamente, do sentir ao compreender e ao saber.
Destacou que o popular sente, mas nem sempre compreende ou
sabe. O intelectual sabe, mas nem sempre compreende e, em espe-
cial, sente. É indispensável, portanto, reconciliar senso comum e
bom senso. Sem essa conexão entre intelectuais e a grande maioria
da população, não se faz política.
Essa relação unitária perpassa todo o trabalho e a formação
de outros conceitos e categorias. Está presente, também, no
estudo da estrutura e superestrutura. Outro exemplo claro é
quando se refere às “ondas” dos movimentos históricos: de um
lado, chamou a atenção para o exagero do economicismo ou do
doutrinarismo pedante, e, de outro lado, para o limite extremo de
ideologismo. Essa bifurcação poderia levar a graves erros na arte
política de construir a história presente e futura e daria lugar a
fórmulas infantis de otimismo.
Outra contribuição importante: estabeleceu uma distinção
metodológica entre dois momentos para a análise de uma situação
concreta, circunstância ou conjuntura: a) um momento unido à
estrutura objetiva, de acordo com o grau de desenvolvimento das
forças materiais de produção: a formação dos agrupamentos
sociais, suas funções e posição na produção. Essa análise permite
dizer se, numa determinada sociedade, já existem as condições
indispensáveis e suficientes para sua transformação; b) outro
momento é a relação política de forças, a avaliação do grau de
homogeneidade, autoconsciência e organização adquirido pelos
diferentes grupos sociais. Na vida real, entretanto, considerou que
estes momentos se confundiam reciprocamente.
E, com base na análise de conjuntura, procurou resolver duas
questões apresentadas por Marx no “Prefácio” de Para a crítica da
economia política: a) “uma formação social nunca perece antes que
estejam desenvolvidas todas as forças produtivas para as quais ela
é suficientemente desenvolvida, e novas relações de produção mais
adiantadas jamais tomarão o lugar, antes que suas condições
materiais de existência tenham sido geradas no seio mesmo da
velha sociedade”; b) é por isso que “a humanidade só se propõe as
tarefas que pode resolver, pois, se se considera mais atentamente,
se chegará à conclusão de que a própria tarefa só aparece onde as
condições materiais de sua solução já existem, ou, pelo menos, são
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Gilvan Cavalcanti de Melo