O imprevisível 2018 PD49 | Page 229

Croce, rebatizado de Concepção dialética da história, Os intelec- tuais e a organização da cultura, Literatura e vida nacional, Maquiavel, a política e o estado moderno), além da seleção das Cartas a cargo de Noênio. Outros nomes da nossa área se mobili- zaram, como Luiz Mário Gazzaneo e Leandro Konder. Um pouco antes, o próprio Gazzaneo e Dalton Boechat haviam traduzido o pequeno livro de Togliatti sobre O caminho italiano para o socia- lismo, pela mesma Civilização. Tudo isso significava uma busca de alternativa à ortodoxia soviética. Havia gente que se mexia, que se inquietava, que buscava inspiração no “diálogo” com os católicos, à maneira dos franceses (como Garaudy), mas principalmente à maneira dos italianos. Evidentemente, a partir do próprio nome a Editora Paz e Terra, coligada à Civilização, carregava esta inspiração ecumê- nica. Leandro Konder se notabilizou muito nesta frente, assim como o dirigente do PCB Luiz Inácio Maranhão, morto na onda repressiva de 1975. Luiz Inácio, um riograndense do norte de fibra, provinha de outra geração, mas tinha no código genético a ideia do diálogo, que ele exerceu na prática inclusive com a alta hierarquia católica, a começar por D. Paulo Evaristo e por seu conterrâneo, D. Eugênio Sales. Para entender esta recepção inicial de Gramsci (deixando de lado tentativas esparsas anteriores), é interessante ver um artigo de um importantíssimo intelectual de língua alemã enraizado no Brasil desde o segundo pós-guerra. Trata-se de Otto Maria Carpeaux, um erudito formidável, dono de notável saber literário e musical. Carpeaux escreveu um artigo sobre “A vida de Gramsci”, publicado na Revista Civilização Brasileira em 1966. 4 Este artigo apresenta sucintamente os livros “temáticos”, destaca a repressão fascista e a ideia de “calar por vinte anos o cérebro” do líder comu- nista, sublinha a densidade intelectual do grupo dirigente do PCI, assinala semelhanças entre Brasil e Itália, entre o Nordeste brasi- leiro e o Sul italiano. A meu ver, um artigo como o de Carpeaux é emblemático desta recepção de Gramsci naqueles anos. A edição Spínola apresenta Gramsci e sua obra, parece-me, sobretudo como um testemunho da crueldade do fascismo contra seus opositores, em particular da área comunista. Pode-se susten- tar que a edição de 2005 das Cartas, dados os elementos paratex- 4 O artigo de O. M. Carpeaux está disponível em: . Uma busca de alternativa à ortodoxia soviética 227