completo as potencialidades estatais. O Estado produtor poderia
estar perdendo para o setor privado, mas é de grande serventia
para a regulação, sobretudo a do capital financeiro. Sérgio Fausto
faz críticas a uma esquerda que “idolatra o Estado” e não poupa
nem o PSDB, tratado como um partido que se desconectou da
sociedade, perdendo base social.
Guilherme Boulos fala a partir dos movimentos sociais.
É uma entrevista com respostas bem previsíveis, uma reflexão
que parece ser homogênea no círculo político em que ele atua.
Boulos divide a esquerda latino-americana em dois grupos, já que
reconhece ter pouco conhecimento sobre a realidade europeia.
Por um lado, fala sobre modelos chavistas de governo, que seriam
aqueles em que se operam reformas estruturais sustentadas nos
movimentos das ruas, e aqui se incluem Equador, Bolivia e Vene-
zuela. Por outro lado, haveria governos de esquerda que se susten-
tam em pactos pluriclassistas, como fez o PT no Brasil. O líder do
MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) vê conquistas
neste segundo grupo, mas limitadas pela falta de ruptura. Os
pactos conseguem sobreviver quando a economia capitalista vai
bem; no entanto, nos momentos de crise, o pacto se desfaria,
como aconteceu com o PT. Neste aspecto, ele tem toda a razão.
Mas Boulos repete o enredo narrativo da esquerda desalojada
do poder, tratando o impeachment sempre como golpe, mostrando
pessimismo quanto às “instituições burguesas” e apostando
muito mais nos movimentos sociais que na política institucional
e nos instrumentos universais que sustentam as democracias
modernas, como os partidos políticos.
Cícero Araújo e Ruy Fausto assinam juntos um belo artigo que
analisa não só as questões relacionadas à democracia como
também à esquerda e às alternativas apresentadas por este
campo. Parte-se do PT como o núcleo avaliativo e acumulador das
esperanças e também das forças de esquerda brasileira. Os auto-
res, assim como seus colegas da coletânea, reconhecem as vitó-
rias sociais das gestões petistas, mas são críticos ao reconhecer
os limites de um partido que abandonou por completo qualquer
perspectiva transformadora. Diante da derrota do socialismo real,
o Partido dos Trabalhadores apareceu como alternativa à onda
neoliberal da década de 90, porém perdeu força mobilizadora e
originalidade, e hoje retrocede ao defender ditaduras ditas de
esquerda, resumindo-se a existir como mais uma poderosa
máquina eleitoral bem distante de sua utopia fundadora.
As esquerdas em crise
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