O imprevisível 2018 PD49 | Page 217

completo as potencialidades estatais. O Estado produtor poderia estar perdendo para o setor privado, mas é de grande serventia para a regulação, sobretudo a do capital financeiro. Sérgio Fausto faz críticas a uma esquerda que “idolatra o Estado” e não poupa nem o PSDB, tratado como um partido que se desconectou da sociedade, perdendo base social. Guilherme Boulos fala a partir dos movimentos sociais. É uma entrevista com respostas bem previsíveis, uma reflexão que parece ser homogênea no círculo político em que ele atua. Boulos divide a esquerda latino-americana em dois grupos, já que reconhece ter pouco conhecimento sobre a realidade europeia. Por um lado, fala sobre modelos chavistas de governo, que seriam aqueles em que se operam reformas estruturais sustentadas nos movimentos das ruas, e aqui se incluem Equador, Bolivia e Vene- zuela. Por outro lado, haveria governos de esquerda que se susten- tam em pactos pluriclassistas, como fez o PT no Brasil. O líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) vê conquistas neste segundo grupo, mas limitadas pela falta de ruptura. Os pactos conseguem sobreviver quando a economia capitalista vai bem; no entanto, nos momentos de crise, o pacto se desfaria, como aconteceu com o PT. Neste aspecto, ele tem toda a razão. Mas Boulos repete o enredo narrativo da esquerda desalojada do poder, tratando o impeachment sempre como golpe, mostrando pessimismo quanto às “instituições burguesas” e apostando muito mais nos movimentos sociais que na política institucional e nos instrumentos universais que sustentam as democracias modernas, como os partidos políticos. Cícero Araújo e Ruy Fausto assinam juntos um belo artigo que analisa não só as questões relacionadas à democracia como também à esquerda e às alternativas apresentadas por este campo. Parte-se do PT como o núcleo avaliativo e acumulador das esperanças e também das forças de esquerda brasileira. Os auto- res, assim como seus colegas da coletânea, reconhecem as vitó- rias sociais das gestões petistas, mas são críticos ao reconhecer os limites de um partido que abandonou por completo qualquer perspectiva transformadora. Diante da derrota do socialismo real, o Partido dos Trabalhadores apareceu como alternativa à onda neoliberal da década de 90, porém perdeu força mobilizadora e originalidade, e hoje retrocede ao defender ditaduras ditas de esquerda, resumindo-se a existir como mais uma poderosa máquina eleitoral bem distante de sua utopia fundadora. As esquerdas em crise 215