A interpretação de Karl Marx
por Hannah Arendt 1
Adriana Novaes
E
m carta de 25 de dezembro de 1950 para Karl Jaspers,
que havia sido seu professor, e tornou-se amigo e inter-
locutor por décadas, Hannah Arendt tenta defender Karl
Marx, afirmando que, enquanto revolucionário, este tinha uma
paixão pela justiça, o que o distanciava de Hegel e o aproximava
de Kant. Pouco mais de dois anos depois, contudo, após Jaspers
reiterar suas críticas e Arendt contar que estava preparando
aulas para um curso em Princeton sobre Marx e a tradição da
filosofia política, ela afirma: “Quanto mais leio Marx, mais vejo
que você estava certo. Ele não está interessado nem na liber-
dade nem na justiça”. Esta afirmação contundente não se desdo-
brou em uma relativização da importância da obra de Marx. Ao
contrário, Arendt reconheceu nas contradições e nos insights, nos
erros e acertos, um dos maiores intérpretes da era moderna. Seu
cuidado é evidente na primeira página do Capítulo II de A condi-
ção humana, em que lamenta a crítica que fará a Marx, citando
a observação de Benjamin Constant sobre sua crítica a Rous-
seau: “Evitarei decerto a companhia de detratores de um grande
homem. Quando, por acaso, pareço concordar com eles em algum
ponto, desconfio de mim mesmo; e, para consolar-me de haver
aparentemente compartilhado de sua opinião... quero renegar e
repudiar o mais possível esses pretensos colaboradores”.
1 Este artigo faz parte da Tese de Doutorado da autora.
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