Military Review Edição Brasileira Quarto Trimestre 2016 | Page 97
COLÔMBIA
das FARC”30. As FARC apontam para esses fatores
quando insiste em manter as suas armas durante e
após o acordo de paz, para garantir a sua proteção,
mas pela mesma razão também espera que as Forças
Armadas façam uma transição da contrainsurgência
para ameaças externas — para adotar o papel que
exerceria em uma democracia estável. A convergência de fatores de risco e de reforma do setor de
segurança pode produzir uma tempestade perfeita de
insegurança e violência, tudo em um tempo de paz.
Apesar da historicamente consistente tendência do aumento da violência depois da extinção do
conflito, as expectativas exageradas de paz frequentemente produzem medidas apressadas, planejadas
para revitalizar a economia. Considerando as vulnerabilidades singulares de uma sociedade pós-guerra,
tais esforços são tipicamente contraproducentes, e os
seus efeitos danosos tendem a ser sentidos particularmente por aqueles mais suscetíveis de remobilização
contra o Estado ou de recorrer aos empreendimentos
criminosos para subsistir.
Em El Salvador, o governo embarcou rapidamente
em ajustes estruturais para modernizar a sua economia em conformidade com os princípios de mercado
prevalecentes de crescimento e de desenvolvimento.
Embora o seu produto interno bruto (PIB) tenha
aumentado em três vezes, entre 1986 e 1994, os níveis
de pobreza cresceram e a desigualdade econômica
piorou. Na época, o desnivelamento econômico do
país e a necessidade de reconstrução e reabilitação
— social e econômica — a serem conduzidas pelo
governo para curar as feridas da guerra prolongada e
evitar o tipo de divisão social que gerou o conflito em
primeiro lugar, foram subestimados.
Em vez disso, incentivado pelas instituições financeiras internacionais, El Salvador prejudicou uma população muito vulnerável em um período altamente
inflamável. Embora a guerra não tenha recomeçado,
o fracasso de controlar as vulnerabilidades pós-conflito contribuiu para o surgimento de novas fontes de
instabilidade: mais desintegração da sociedade salvadorenha, destruição de bens, ilegitimidade governamental, migração descontrolada e o crescimento das
estruturas de gangues e dos crimes violentos.
Como Mats Berdal descobriu, “a conclusão formal
do conflito armado, especialmente se atingida por
meio de um acordo negociado, raramente acarreta
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uma ruptura clara dos padrões de violência passados, tampouco significa que as queixas que deram
origem ao conflito, em primeira instância, tenham
sido inteiramente removidas”31. Na Colômbia, as
negociações se concentraram decisivamente em quais
concessões oferecer às FARC, mas as populações que
foram vítimas dela continuam a ter dificuldades e é
improvável que sejam cuidadas adequadamente pelo
Estado. Considerando o declínio econômico atual da
Colômbia, é bem provável que o governo seja incapaz de alcançar e incorporar as comunidades críticas
em uma forma que as imunize contra alternativas
violentas32.
Isso é importante, desde que foram exatamente
as relações do governo com o seu povo que serviram
de base para a Política de Segurança Democrática.
Ao identificar a legitimidade do governo como o seu
centro de gravidade, a campanha de contrainsurgência estendeu o alcance do Estado às comunidades
há muito negligenciadas, por meio da imposição de
um imposto de guerra aos mais ricos, oportunidades
socioeconômicas e da geração de mais inclusão social
e geográfica de que a Colômbia nunca antes havia
visto33. Entre 2002 a 2010, os anos da Política de
Segurança Democrática, o crescimento econômico
em média, o PIB per capita, e a cobertura de saúde
dobraram, tudo enquanto os índices de pobreza diminuíram de 53% a 37%, e a inflação de 6,9% a 2,5%.
Em contrapartida, em março de 2016 a inflação
atingiu 8%, o nível mais alto desde outubro de 2001.
O investimento direto estrangeiro tem