Joias Hotel Joias Hotel | Page 90

Gilberto Candido MAMMA ROSA Não sou muito adepto a certas modalidades populares da internet. Mas numa certa vez me rendi à tentação no batepapo virtual. Por coincidência, peguei o Douglas on-line — um antigo ex-colega de hotelaria que já não me correspondia nem por e-mail mais. E, sabe como é, né? Deu-me aquela vontadezinha de saber o que ele andava aprontando. Uma de suas primeiras perguntas zombeteiras, sem que eu tivesse me dado conta, foi: “Onde você aprendeu a desenhar?” Me enchi de orgulho e respondi: “Aprendi sozinho. Sou autodidata.” E ele: “Bem que desconfiei. Tu desenhas mal pra burro, hein?” (Ter certa intimidades com certas pessoas é foda!) E ele continuou: “E onde aprendeu a contar e escrever casos?” E eu: “Aprendi a contar casos observando o cotidiano e a coordenação de minha mãe neste contexto. E aprendi a escrevêlos lendo livros”. Acho que o desarmei. Ele ficou sem jeito de falar mal de minha mãe e desapareceu em off. O fato era que eu não estava mentindo. Com toda a sua simplicidade, minha mãe tinha a arte de citar personagens (reais e fictícios) numa dramaticidade shakesperiana de aproveitável conteúdo a qualquer dramaturgia contemporânea, e, num repente, transformar o mesmo roteiro num suspense que, despretensiosamente, descrevia Agatha Christie e, munida de toda a habilidade crônica que a natureza lhe deu, desviar o 90