Gilberto Candido
FOGO NO CIRCO
De manhã o telefone do hotel toca e a recepcionista
atende. Do outro lado da linha uma mulher solicita:
— Por gentileza, me transfira com o hóspede do apartamento 126.
— O hóspede do apartamento 126 não se encontra
senhora. Acabou de sair com a esposa.
— Com quem?
— Com a esposa, senhora.
— Ok... Obrigada... Então, ligarei no celular dele.
Ligou nada. A mulher bateu o telefone e, pela rapidez com
que chegou ao hotel, só pode ter vindo de táxi aéreo lá de Bauru,
de onde decolou. Entrou pisando alto, numa pilha de nervos,
fumando e se identificando como a esposa do hóspede do quarto
126: a primeira, legítima e única — pelo menos, a que deveria
ser segundo os seus direitos matrimoniais.
No decorrer daquele dia, o assunto não poderia ter sido
outro. Eu aderi à maioria que pré-julgou a recepcionista achando
que aquela entregada foi proposital. Com um currículo invejável
e anos de experiência, diríamos que aquela nossa colega já era
uma “macaca velha” e jamais cometeria tamanha gafe se não
fosse com a única e maldosa intenção de ver o circo pegar fogo.
A mulher, que veio voando e se remoendo, já chegou de
caso pensado: pediu a chave do quarto 126 para esperar no
apartamento e fazer uma surpresa ao marido cafajeste quando
este chegasse.
50