Inominável Nº 3 | Page 43

Poderia,

claro que poderia

conceder-me, de quando em quando,

a textura suavíssima da seda,

o rebuscado colorido da cauda do pavão,

o verso liquefeito nos preciosíssimos licores

que nunca chegam

aos lábios de quem moireja a terra

onde o chão pouco mais oferece

do que a haste sequiosa

das altivas torgas...

Poderia,

poderia sim,

procurar na gratificação pessoal,

a doce anestesia do ópio,

o requinte da fragrância mais rara,

o aplauso ocasional e gratuito,

o beijo fácil da simpatia caritativa,

o brilho do néon

que ofusca a borboleta

e invariavelmente queima

quantas asas germinem nos casulos...

Poderia,

sei que poderia,

adornar-me de pérolas, topázios e diamantes,

Mas... por que o faria

quando um seixo rolado

se me afigura infinitamente mais belo?

Post scriptum;

Quem me compra

este dilúvio de (in)certezas

por um punhado de versos rolados?

POST SCRIPTUM

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Nº 3 - Abril, 2016