Inominável Nº 1 | Page 8

D

falavam, como o faziam com British accent! A minha mãe tinha um estranho fascínio por tudo o que se relacionava com as famílias reais, sendo a inglesa uma das suas preferidas, talvez por todos os amores e desamores que faziam as notícias, normalmente nas revistas cor-de-rosa, onde a par da coscuvilhice de sangue azul vinham as imagens de uma baixa londrina cinzenta e romântica, que me faziam sonhar em lá ir.

Vim este ano de malas feitas para terras de Sua Majestade, onde resido há quase oito meses. Parti para esta aventura num dia auspicioso, sexta-feira santa, véspera da Páscoa e do símbolo do renascimento, mas também dia de anos do meu filho. Ofereci-lhe como prenda de aniversário uma viagem só de ida, e a esperança da concretização dos nossos objectivos.

A primeira paragem nesta que ia ser uma longa jornada foi em Liverpool, onde iríamos passar um mês na casa de uns amigos. Havíamos deixado para trás um céu azul de trinta graus e nunca mais me vou esquecer, quando saí do avião, do impacto/choque que sofri ao ser atingida por uma rajada de chuva e vento gelado. A meu lado, uma mulher de ar bronzeado e chinelos nos pés, com o ar mais feliz que possam imaginar, com aquele não-sei-quê de aconchego que se sente ao regressar a casa. Olhou para mim e com um sorriso rasgado (que descobri mais tarde ser característica de um povo a que chamamos “frio”), exclamou: “Welcome to Liverpool!”. Fechei o meu casaco até ao queixo e sorri de volta. Era o início de uma nova vida, e o apartamento, o emprego das nove às cinco, a família (onde se incluem os dois gatos) tinham ficado para trás. Não havia volta a dar, a não ser sorrir de volta para as novas oportunidades que iriam surgir. Mas não surgiram em Liverpool, uma cidade grande e cinzenta, muito mais suja e barulhenta do que o meu imaginário idealizava, bem regada a álcool durante a noite, onde o frio não impede os vestidos ultra curtos e as pernas despidas de meias, e onde as mulheres parecem todas iguais, com make-up para lá do razoável. Por graça, o meu filho até dizia que Liverpool parecia uma fábrica de bonecas, todas saídas do mesmo lote!

O segundo choque a seguir ao clima foi a língua. Eu, convencida de que esse não seria o meu problema, definitely, dei por mim a desejar, em certas situações, que tivéssemos um tradutor automático incorporado, sendo “Excuse me?”a pergunta que mais formulei naquele mês! O Scouse accent é, sem dúvida, um universo linguístico à parte! No entanto, a cidade tem edifícios de arquitectura maravilhosa e sítios icónicos, como a loja dos Beatles ou Albert Dock, docas maravilhosas cheias de história, onde desembarcaram tantos emigrantes, local de passeio agora com lojas e carrinhas de gelados, risos no ar e gaivotas a pairar...

Naturalmente não pudemos deixar de visitar o Merseyside Maritime Museum, onde li algo que me

por Inês Rocha

esde pequena, muito pequena, que me lembro de gostar de tudo o que era proveniente de Inglaterra, desde a sua língua e musicalidade, aos desenhos animados em que os animais não só

8