Inominável Ano 2 Inominável Nº6 | Page 68

UM PORQUÊ

Há um novo porquê suspenso no teto.

Cada vez que o olho

quero dizer que esses são os dias bons

aqueles em que as perguntas se renovam

sem resposta necessária

ou suficiente. Sei lá das suficiências

ou necessidades.

Sei dos dias cheios de porquês

que se balançam como se quisessem

gerar ideias.

É talvez por isso que existe o teto

não para me tapar as dúvidas.

Lá fora o dia juntou todas as cores

branco límpido.

Se perguntasse para onde foi o azul

ou o dourado

estaria a inventar mais um porquê

e não posso.

A regra manda que se suspendam do teto

para que os dias possam ser brancos

e não haver dúvidas.

in “Um pássaro antigo nos olhos”, pag. 24, editora Modocromia

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O SILÊNCIO POR DENTRO DA COR

Sinto uma raiva contida nas esquinas do tempo

um sopro hostil

que tolhe o movimento.

Paro um pouco.

Afinal os dias podem abrandar

o ritmo interior

sem que nada se parta, se perca

de algum antigo ardor

ou chama vital.

Que sei eu do que me leva?

Que sei do bem ou do mal?

Paro um pouco

ou muito ou tudo ou o que for.

Que se oiça o silêncio por dentro da cor

dos sons,

até que a claridade se revele inteira

sem sombras de fingida dor.

Que a balança suba o prato da entrega

leve, leve pena pairando no ar

livre de amarras.

Porque um certo dia essa hora chega

no áspero vento das bandas do mar.

Tempo de pensar.

in “Um pássaro antigo nos olhos”, pag. 20, editora Modocromia