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- Tipo de corpo nilótico. Os Kalenjin têm um corpo muito esguio (útil, como vimos antes, para a poupança de energia durante a corrida). Este tipo de corpo desenvolveu-se em zonas quentes e secas, uma vez que as proporções esguias funcionam melhor para o arrefecimento do corpo, um factor muito importante para a economia de energia durante uma corrida longa.

- Evolução em altitude. É conhecido que treinar em altitude aumenta a quantidade de glóbulos vermelhos no sangue, e melhor do que treinar é nascer em altitude, porque permite que o corpo se adapte durante a sua evolução. Mas então porque não há mais corredores do Nepal, ou dos Andes? A resposta não tem apenas a ver com a questão do tipo de corpo, mas também como cada povo se adaptou a viver em altitude. A quantidade de oxigénio no sangue é determinada pela quantidade de hemoglobina que temos e quanto oxigénio essa hemoglobina transporta. Os habitantes dos Andes respondem à falta de oxigénio com um aumento da quantidade de hemoglobina, o que implica um sangue mais viscoso e que circula com menos facilidade, nada ideal para a prática de desporto prolongado. Os tibetanos têm níveis de hemoglobina normais e quantidades de oxigénio transportado baixas (normais em altitude), mas as quantidades elevadas de oxído nítrico aumentam a velocidade de passagem do sangue nos pulmões, levando a uma respiração mais rápida e profunda; aumenta a quantidade de oxigénio no sangue, mas leva a um gasto maior de energia, também negativo na prática de desporto. Um estudo dos Amhara, da Etiópia (muito próximos e com um tipo de corpo semelhante aos Kalenjin), revelou que estes têm uma quantidade de hemoglobina normal e uma quantidade de oxigénio transportado normal também – mas muito pouco normal nestas altitudes. Quando descem para altitudes próximas do nível do mar aumenta a quantidade de oxigénio transportado para valores próximos do máximo possível, sem gastarem mais energia por isso.

Nenhum destes factores explica, sozinho, a preponderância absurda que etíopes e quenianos, sobretudo Omoro e Kalenjin, têm nas corridas de fundo. As questões genéticas parecem ter uma importância grande, mas não podemos descurar os factores culturais – Fernanda Ribeiro, medalha de ouro dos 10.000m, também corria para a escola – e sociais – o efeito funil de procura exaustiva de talento para um determinado desporto é a razão principal para o domínio que os EUA têm no basquetebol mundial. Enquanto que outros países como a Finlândia, EUA e Reino Unido, as grandes potências mundiais do fundo entre as Grandes Guerras, têm ficado mais lentos (entre 1983 e 1998 o número de homens norte-americanos que correram a maratona em menos de 2h20m desceu de 267 para 35, no Reino Unido de 137 para 17, a Finlândia não apurou um único atleta de fundo para os Jogos Olímpicos de 2000), os Quenianos focaram toda a sua atenção neste desporto, por razões socio-económicas. Mas também porque, por razões genéticas (sobretudo nesta era de especialização em tudo, incluíndo no desporto), é muito mais provável encontrarmos o próximo recordista da maratona em Iten do que no resto do mundo.

Nº 5 - Dezembro 2016

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