Inominável Ano 2 Inominável Nº5 | Page 10

Ler com

as Redes Sociais

Muitas vezes ficava eu e as perguntas. Eu e as dúvidas. Eu e a vontade de saber se haveria mais alguém, uma pessoa que fosse, a sentir as palavras como eu. Ou a viver o oposto. A interpretar tudo ao contrário de mim.

Comecei a escrever no meu blogue para superar o vazio do fim dos livros. Comecei a escrever opiniões curtas com aquilo que me ficava a remoer a cabeça depois das leituras, o que imaginava que podia usar em conversas se tivesse com quem conversar sobre livros. Havia próximo de mim quem gostasse de livros e os lesse, claro, mas não ao ritmo a que eu lia. Não conhecia outras pessoas que partilhassem do meu entusiasmo e da minha vontade de ler sempre mais e mais. A leitura é uma actividade solitária e eu, apesar de alimentar bastante a solidão necessária para ler, comecei a sentir uma enorme necessidade de saber onde estavam os outros leitores como eu. Haveria mais alguém? Sim, esta questão é pertinente, quando se vive os livros como eu é inevitável não questionar se se terá algum problema. Uma obsessão literário-compulsiva, por exemplo. Sabe-se lá.

Então, de uma forma inesperada, que eu ainda hoje não consigo explicar, o meu blogue começou a ter interacção. E foi um comentário ou um e-mail que mudou para sempre a minha forma de viver as leituras. Dos blogues às redes sociais o caminho é curto, mas eu levei anos. Devo ter sido das últimas pessoas a ter facebook e goodreads e este é, na verdade, um caminho sem volta. A informação disponível é imensa e, de repente, há tanta gente que gosta de ler, que os primeiros tempos nas redes sociais parecem uma constante festa. A novidade, aliada às conversas sobre os livros que se leram, os que se lêem e os que se querem ler, encheram-me de vontade de falar e de amigos, que se somavam à velocidade a que eu os adicionava e era adicionada. O efeito imediato destes encontros foi uma redução do tempo dedicado a ler. O que é mau. E que eu sabia ser mau pois sentia a falta de ler em sossego. Sim, porque passei a ler na companhia dos amigos novos, sempre com uma necessidade estranha e inexplicável de contar a todos o que estava a ler.

E de saber.

A vontade de saber é talvez o que neste momento me leva mais às redes sociais. Sejamos francos, já não há surpresas. Já não compramos livros sem saber o tema, as opiniões da crítica e, mais importante, as opiniões das pessoas que seguimos e que mais valorizamos, por se aproximarem do que pensamos e por terem gostos semelhantes aos nossos.

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Quando eu comecei a ler não havia redes sociais.

Fiz-me leitora na solidão das páginas, no isolamento que os livros merecem

e de que eu muitas vezes (ainda) preciso.

Encerrada a última página, ficava eu e o silêncio.

Nem sempre.

por Márcia Balsas