Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo FRATERNIDADE_MANIERI | Page 51
Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo
A exigência da tolerância decorre da consideração, ditada
pela razão, da comum condição e do comum destino que
irmanam os seres humanos: “A tolerância é uma consequência
necessária de nossa condição humana. Somos todos filhos da
fragilidade: falíveis e propensos ao erro”. 21 Ninguém tem o
monopólio da verdade e do bem nem em última análise da sal-
vação. Por isso, a tolerância é direito de todo homem e de todo
cidadão: “Será permitido a cada cidadão só crer na própria razão
e pensar aquilo que esta razão, esclarecida ou enganada, lhe
ditar? Certamente”. 22 Só nos resta, pois, comportarmo-nos fra-
ternamente, mesmo quando não compartilhamos as ideias
alheias ou as consideramos erradas, e “perdoarmo-nos recipro-
camente nossas loucuras: esta é a primeira lei natural. O prin-
cípio como fundamento de todos os direitos humanos. O direito
à intolerância é absurdo e bárbaro, é o direito dos tigres, aliás,
bem mais horrendo, porque os tigres se despedaçam para comer,
nós nos exterminamos por parágrafos”. 23
Daí a polêmica com os católicos: “Nós, cristãos, não fomos
perseguidores, carrascos, assassinos? E de quem? De nossos
irmãos. Nós, com o crucifixo ou com a Bíblia na mão, destru-
ímos muitas cidades e não cessamos de derramar sangue e
acender fogueiras, desde o reino de Constantino até os furores
dos canibais que habitavam as Cevenas”. 24
Eis que, poderosa, a oração se eleva a Deus: “Faz com que nos
ajudemos mutuamente a suportar o fardo de uma existência
penosa e passageira; que as pequenas diferenças entre as roupas
que cobrem nossos corpos frágeis, entre todas as nossas línguas
insuficientes, todos os nossos costumes ridículos, todas as nossas
21 Voltaire, Trattato sulla tolleranza, cit., p. 113.
22 Idem, p. 88.
23 Ibidem.
24 Ibidem.
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