Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo FRATERNIDADE_MANIERI | Page 142
Maria Rosaria Manieri
de Estados repressivos e do que um dogma político. No plano teó-
rico, a falência da revolução comunista foi “o toque fúnebre para a
promessa bicentenária de progresso radical”; no político, “com o
colapso do socialismo real se desfez toda a teia de doutrinas que
unificaram a esquerda por mais de um século”. 74 Também o libe-
ralismo mudou de posição. Historicamente, de fato, ele construiu
sua legitimidade em relação às desigualdades naturalizadas do
feudalismo, pressuposto como seu passado, e às repressões intole-
ráveis do comunismo de Estado durante o século XX. O colapso
global do comunismo eliminou “outro termo de comparação cru-
cial para a identidade do liberalismo, cancelando literalmente o
oposto em relação ao qual a liberdade liberal contemporânea
podia ser imaginada”. 75 Palavras como liberdade, liberalização,
desregulamentação terminaram por indicar nada mais do que a
tendência a atribuir um poder decisivo àqueles que são conside-
rados os novos determinismos econômicos, livrando-os de qual-
quer limite e de qualquer controle. Com notável salto para trás,
que marca o retorno a bem antes da crítica marxiana à economia
política, o capitalismo tende de novo a se apresentar, de resto em
escala global, como natureza, mundo físico imutável, realidade
única além da qual existe o nada. 76 “A crise, afinal rápida, dos sis-
temas político-sociais ditos do socialismo real voltou a dar fôlego,
de modo espetacular, ao mito da eternidade do capitalismo”. 77
A naturalização da economia – afirma Jean Ziegler – é “a última
astúcia da ideologia neoliberista”. 78
O capitalismo globalizado, além disso, mostra-se intole-
rante com todo e qualquer limite. Exige investir e desinvestir
onde quiser e quando quiser, desconsiderando os homens e sua
74 Judt, Guasto è il mondo, cit., p. 104.
75 Brown, La politica fuori dalla storia, cit., p. 14.
76 P. Bevilacqua, Elogio della radicalità, Roma-Bari, Laterza, 2012.
77 L. Canfora, È l’Europa che ce lo chiede, Roma-Bari, Laterza, 2012, p. 58.
78 J. Ziegler, La privatizzazione del mondo, Milão, Il Saggiatore, 2005, p. 56.
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