Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo FRATERNIDADE_MANIERI | Page 139

Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo Para se tornarem indivíduos livres e universalmente reali- zados, “os filhos do capitalismo” devem mudar: “Os homens fazem a si mesmos. Eles não podem mudar sem mudar o mundo. Mas, mudando o mundo, eles mudarão a si mesmos: no processo da revolução. A revolução será total, e esta ‘totalidade’ implica inclusive a mudança total dos homens”. 67 Mas, segundo Heller, o problema real subjacente à ideia revolucionária de Marx não consiste no fato de as pessoas que mudam o mundo mudarem a si mesmas dentro e através deste processo, coisa inteiramente assentada, mas de estarem desti- nadas a mudar a si mesmas numa direção específica (de liber- dade, abundância e assim por diante). O erro de Marx é a iden- tificação da “mudança para melhor com a mudança pura e simples”, que por si só não precisa de avaliação moral porque “a mudança conduz, de todo modo, na direção do bem supremo”. 68 O fim não é escolhido, mas simplesmente dado, e é por isso que não pode funcionar como valor, como ideia que regule a ação. Não há nenhuma obrigação moral justamente para aquela classe de que se espera instaurar o mundo totalmente moral. Daí aos equívocos marxistas da moral como pura expressão do interesse de classe, do qual, no Lenin do Que fazer?, só o Par- tido é depositário e ao qual o trabalhador individual deve cego sacrifício, o passo foi curto. A interpretação de Marx constitui uma interpretação do mundo em função de sua mudança, mas nem a simples interpre- tação do mundo pode estar isenta de juízos de valor. Por isso – afirma Heller –, é preciso reabrir o “caso Marx”, tornando a partir deste ponto e tratando seu pensamento separadamente dos marxismos e das interpretações dogmáticas e deformadoras 67 A. Heller, L’eredità dell’etica marxiana, in Storia del marxismo. 4. Il marxismo oggi, Turim, Einaudi, 1982, p. 495. 68 Idem, p. 496. 137