paulo rodrigues ferreira
no nariz, não superaria outras provações que como
profissional da vilanagem teria de enfrentar. O que talvez
escapasse a Nero era o facto de o indivíduo ensacado não o
conhecer de lado algum e nunca ter ouvido a sua voz. «Cá se
fazem, cá se pagam.» Um Nero esforçadamente nasalado,
tentando empregar corretivo que vingasse a sua princesa
anodonte,
prenunciava
óbitos,
naifadas,
marradas,
marretadas, mocadas, pauladas, ripançadas se, teimava no
se, a sua Mon Chéri (como reverenciava aqueles bombons)
fosse novamente fornicada com uma fronha na cabeça. «O
que me respondes, manigâncias?», perguntava num berro.
Como qualquer pessoa de boca cheia de pano, Orestes soltou
uns cuincados mas nada perceptível. O inteligente Nero não
demorou a compreender que o pano enxertado na boca do
ensacado não desaparecia por intervenção divina. A mola
apertava-lhe tanto o nariz que parecia que, se tossisse ou
espirrasse, perderia a cabeça. O nariz, panela de pressão,
cortava-lhe capacidade de raciocínio. Pouco demorou até que
Nero tivesse tirado a mola do nariz e destapado a boca e
desensacado o sujeito que tão mal fazia à sua Prolixa.
Orestes resfolegava deitado na terra, pedia desculpa por ter
desrespeitado a prostituta, que nem prostituta era, mas
senhora, dama, menina, flor, docinho, uvinha, cerejinha. Um
abraço de reconciliação entre dois desconhecidos, um chuto
na saca e a Prolixa esquecida. «Aquela cara mete real nojo»,
52