FRANCISCO VILAÇA
arrasta-se com o ronronar dos chinelos no tapete, e se as
certezas da cabeça nem sempre são certas, já as do
coração estão gravadas na pauta dos batimentos,
emergem discricionárias como a ilusão dos que ainda
cogitam viver em liberdade, o fim, bah, a vida encarregarse-á do fim, projectado e incubado pela astúcia divina de
um Deus que não castiga, não, não desdenha, não inveja,
não cobiça, e não perdoa, brinda com sádica e lenta
tortura, a memória vigorosa da pauta, mecânica e
persistente, resiste até que finalmente a senilidade enxote
os resquícios do longínquo, parcialmente estilhaçados
pelas orações determinadas que o pequeno rádio da
cozinha, todos os dias sem excepção, pregou às sete da
tarde, e pelo amor de quem amou, sim, porque também
houve tempo de amar e ser amada, como uma Mulher o
deve ser, com verdade e rendição, e ali mesmo desperta-se
no espelho para um par de seios mirrados, confusos e
desmoralizados, fitando o chão, exactamente onde
outrora Maria Aparecida se ostentou orgulhosamente
num peito opulento e sedutor, e nos olhos gulosos dos
vizinhos, retrato Caleidoscópico da juventude, os
contornos da blusa (maldito sejas), e as saias acima do
joelho, que estimulam desejo libido, combustível de
loucuras apaixonadas e paixões idiossincráticas, (que
venha a cruz que de mim se carrega), desperta-se para as
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